Compêndio de Civilidade de 1916 - com ortografia da época

COMPENDIO DE CIVILIDADE
PARA USO
Das familias e dos Institutos educativos
S. Paulo
Escolas Profissionaes
Do Lyceu Salesiano do Sagrado Coração de Jesus
- 1916 -


PREFACIO DOS EDITORES

Já de ha muito se fazia sentir a falta de um compendio de civilidade sufficientemente desenvolvido e adaptado ás familias e collegios catholicos, no qual os preceitos fossem acompanhados de considerações moraes e religiosas, formando assim um pequeno tratado de boa educação.

É o que nos parece haver conseguido dando á luz este modestissimo opusculo, quasi exclusivamente destinado a alumnos de collegio, e aos jovens filhos de familia.

Sem a pretenção de haver exgotado o assumpto e reconhecendo haver no presente trabalho numerosas lacunas que em futuras edições se poderão preencher, afigura-se-nos elle no entanto muito util á mocidade que, lendo-o e estudando-o, se convencerá de que a civilidade nada mais é que uma parte da caridade – virtude christã basilar na doutrina catholica - e que, por conseguinte, não podemos ser bons catholicos se não praticarmos a mais cortez urbanidade.

Sendo muito embora verdade que pessoas ha extremamente cortezes sem no entanto praticarem o catholicismo, podemos asseverar que a sua urbanidade é forçosamente falha e superficial, porque não se inspira na caridade christã e não attinge a sua força e efficácia na escola dessa sublime virtude.

Ahi está a experiencia a dar plena razão ao que dizemos.

Um catholico convicto e praticante que fôr ao mesmo tempo o typo do cavalheiro é destinado a tornar-se o ídolo da sociedade. Eis o ideal que com todas as véras desejamos possam attingir os nossos jovens e alumnos.

Nada ou quasi nada, porém, se poderá conseguir, se o presente livrinho não se considerar como texto para uma verdadeira aula de civilidade a que se dê pelo menos a mesma importância que se dá a outras aulas dos cursos, e para a qual se escolham professores sob todos os pontos de vista competentes.

Taes professores, em vez de fazerem conferencias ou prelecções, devem explicar passo a passo o compendio, fazer delle um como catecismo civico-moral, mandar decorar em resumo os preceitos geraes, acompanhar a aula theorica com as lições praticas em que se façam movimentos, se entabulem diálogos, se manuseiem objectos etc. etc.; e tudo isso repetido até se formar na creança e no jovem o habito da civilidade.

Inutil será, porém o trabalho da aula, se depois não se verificar se o alumno pratica ou não o que lhe foi ensinado, seguindo-o de perto nas suas relações com os superiores, eguaes ou inferiores, nas suas conversações, na egreja, nas aulas, nos recreios, na sala de jantar, no dormitorio etc. Só assim é que poderá ser eficaz o ensino.

Oxalá o façam os educadores catholicos! Terão contribuido para se banir de vez preceito de que os collegios catholicos não sabem formar os seus alumnos para a visa intensa e complexa da moderna sociedade.

São estes os votos que compilaram e adaptaram o presente opusculo.

São Paulo, 1° de Junho de 1916.

I

Deveres para com Deus

1. Deus, Creador e Soberano Senhor de tudo quanto existe, merece todo o respeito e veneração.

Consagra-lhe, pois, os melhores affectos de teu coração e tributa-Lhe todos os dias a homenagem da oração temendo summamente offendel-O.

2. Recorda-te que o temos de Deus é o princípio da sabedoria e a base da santidade: d´Elle amana todo o bem. Segue o conselho do bom Tobias a seu filho: “Pensa no Senhor todos os dias e guarda-te de peccar contra Elle e de transgredir os seus mandamentos”.

3. Ao respeito e amor devidos a Deus, acrescenta o amor e o respeito para com a sua religião e os seus ministros. Dos ministros de Deus ou fala bem ou então cala-te, como fazes com as pessoas que te são caras.

4. Não questiones de religião quando não tiveres feito sérios estudos; d´ outro modo poderias offender a Deus e ás cousas santas.

5. Toléra as crenças religiosas dos outros, mas confessa sincera e francamente a tua fé. Todos, incluindo os impios, admiram o caracter dos que não se envergonham da propria fé. Respeita as opiniões dos outros quando se trata de cousas discutiveis.

6. Guarda-te de imprecar ou mesmo de usar em vão o nome de Deus, da SS. Virgem e dos Santos, embora por gracejo ou por desabafo de ira, como fazem alguns, nesciamente.



II

Deveres para com os paes


1. Depois de Deus, é aos nossos paes que mais devemos. Não satisfeito de prometer vida longa e bênçãos nesta terra aos bons filhos, Deus ameaça com o rigores dos seus castigos e maldições, aos filhos que descuram os seus deveres. Taes deveres reduzem-se a dois: amor e respeito.

2. O primeiro dever para com os paes é o de amal-os. É este um sentimento natural, e seria desnaturado o filho que não o tivesse.

3. A primeira prova de amor para com os paes é prestar-lhes obediencia e submissão em tudo o que fôr lícito. É detestável e repreensível a ousadia de responder aos paes, “não quero”, bem como a exigência nos pedidos e o ressentimento pelas negativas recebidas.

4. Ao contrário, como é louvável o proceder daquelles filhos que em tudo se submetem, em tudo consultam aos paes e isto com expressões limadas, taes como: “se é do seu agrado papae; se a senhora deseja, mamãe; com sua licença, etc.”!

5. Evita tudo quanto direta ou indiretamente possa desgostal-os perturbal-os em suas ocupações, tirar alguma cousa sem o seu consentimento, contradizel-os, queixar-te, responderes com maneiras bruscas. Procura ao invés fazer tudo quanto lhes possa dar gosto.

6. Não digas nunca a menor cousa que possa lesar a honra dos teus progenitores; antes, nada deves dizer do que se passa em casa.

7. Guarda-te de qualquer expressão de desprezo, injúria, arrogância ou irrisão. No Antigo Testamento Deus fulminou com palavras de morte aos filhos que dissessem imprecações ou maldições aos próprios paes.

8. Não deves manifestar os seus defeitos ou critical-os, mas sim encobril-os, excusal-os, compadecel-os. Infeliz do que se julga censor dos defeitos dos seus paes.

9. Não uses para com elles maneiras bruscas, como sacudir desdenhosamente os ombros, voltar-lhes as costas, abanar a cabeça, bater com os pés, olhar de esguelha, levantar a voz ou, o que seria hediondo, ameaçar-lhes e bater-lhes.

10. Mais: É preciso em qualquer circunstância manifestar com palavras e com atos o respeito e a veneração que se lhes tributa, tanto em casa como fora, com os estranhos, e com os parentes.

11. Reza pelos teus paes todos os dias. Retribui-lhes com gratidão a benevolência e o amor que te consagram. O filho que regeita os carinhos de seus progenitores e recusa retribuil-os, merece ser privado do amor de seu pae e de sua mãe.

12. Vai-lhes ao encontro pela manhã e saúda-os tomando-lhes a bençam; o mesmo farás á noite antes de te deitares.

13. Nossos paes merecem-nos, mais do que quaisquer outros, estima e respeito. Quem se mostrasse educado para com todos e incivil para com seus paes seria um impostor.

14. Procura de bom grado sua companhia. Há jovens que preferem a companhia dos amigos á dos paes, alegando que os paes têm sempre perto de si. Que má correspondência!... E os paes (pobres paes!), vêm-se muitas vezes constrangidos a calar.

Dia virá em que estes filhos indiferentes sentirão falta de seus progenitores e chegarão a compreender toda a sua ingratidão!...

15. Finalmente sê aberto e franco para com teus paes, deposita nelles toda a confiança, porque elles são os mais desinteressados de si e os mais interessados pelo bem de seus filhos. Empenha-te em ser para com teus paes o que foram e são elles para contigo; e, sendo impossível recompensar-lhes o amor que te dedicam, faze quanto estiver ao teu alcance para retribuir cuidado por cuidado, sorriso por sorriso.

16. Tuas maneiras e teu proceder sejam taes, que só o verem-te lhes cause alegria e consolo. Todo o sorriso que a seus lábios fizeres assomar, toda a consolação que lhes despertares na alma, ser-lhes-á grande recompensa que redundará também em bencams para ti. As bencams dos paes são sempre confirmadas por Deus.

17. Felizes dos filhos que desempenharem com fidelidade estes deveres. Serão abençoados por Deus na vida, na morte e na eternidade. Mas ai dos filhos desobedientes que amarguram os dias dos seus paes! Elles atraem sobre si nesta vida, as maldições de Deus, que são o prenúncio das maldições e castigos da outra vida. Maldito quem não honra seu pae e sua mãe, diz a Sagrada Escritura!

III

Deveres para com os superiores

1. Tudo o que se disse em relação aos teus paes, considera-o dito também em relação aos teus superiores, porque elles fazem as vezes dos teus paes. São teus superiores: o Diretor do Collegio e os que o auxiliam na direção, os teus assistentes, vigilantes, prefeitos ou inspetores, como quer que sejam chamados, os teus mestres e em geral todos aquelles de que em alguma maneira dependes. Como superiores considerarás também os anciãos e como taes os respeitarás.

2. A obediencia aos Superiores é para um jovem, o fundamento de toda a virtude, e por isso o seu primeiro dever. “Obedecei aos que vos são dados por guia e sede-lhes submisso, diz o Apóstolo S. Paulo, porque elles deverão dar de vós contas a Deus. Obedecei não á força, mas de bom grado, para que os vossos superiores possam cumprir seus deveres com alegria e não entre lágrimas e suspiros.”

3. Persuade-te de que os superiores compreendem a obrigação que lhes assiste de promover o teu bem-estar, e avisando-te, mandando-te e corrigindo-te, não visam senão o teu bem.

4. Procedem mal os que não se aproximam dos seus Superiores, antes os fogem. Os que mais se acercam dos superiores, são os que recebem mais avisos e conselhos.

5. Dá-lhes todas as demonstrações de afecto e reverência que bem merecem, saudando-os quando os encontrares, conservanto-te descoberto em sua presença, antepondo-lhes ao título a palavra Senhor, como: Senhor Diretor, Senhor Professor etc. e bem assim nas afirmações e negações: Sim, senhor, - não senhor.

6. Seja a tua obediencia, pronta, respeitosa e alegre, não fazendo observações para te esquivares, não murmurando ou fazendo gestos de desgosto; obedece mesmo quando o que te mandarem não fôr de teu gosto, porque então ser-te-á mais meritória a obediencia.

7. Obedece ainda quando o superior estiver ausente, porque só os de instintos perversos aproveitam a ausência ou distração do superior para cometer faltas ou desobediencias.

8. Deves ter muita confiança com os teus superiores, mas nunca excessiva familiaridade, por mais que elles se mostrem afáveis para contigo.

9. Pode ser boa educação oferecer aos superiores alguma bebida ou comida, mas não insistir para que aceitem. Não é conveniente que lhes peças taes cousas; quando porém te as oferecerem, aceita-as com reconhecimento e agradece-as.

10. Abre teu coração ao Superior, considerando-o como um pae que só deseja o teu bem.

11. Escuta reconhecido suas correções e, sendo necessário, recebe com humildade castigo das tuas faltas, sem mostrar desamor ou ressentimento para com elles.

12. Evita a companhia daquelles que, enquanto os superiores se dedicam de corpo e alma ao bem de seus alumnos, censuram-lhes as disposições. É este um sinal de máxima ingratidão.

13. Quando fores interrogado pelo superior a respeito do proceder de algum colega, responde com franqueza o que souberes, principalmente se se tratar de impedir ou remediar algum mal. O silêncio em tal caso seria de dano ao companheiro e de ofensa a Deus.

14. Sê sempre grato para com os teus superiores. A gratidão é uma veste preciosa que se torna bela e agradável a todos; é o íman que atrai sobre ti os dons da Providência. Esquece-te muito embora dos benefícios que a outrem fizeste; nunca, porém, te esqueças dos que tu próprio recebestes.

IV

Deveres para com todos

1. Para com todos deves ser respeitoso e cortez. Venera e honra a teu próximo como a teu irmão e procura edificar a todos com o bom exemplo.

2. Se puderes prestar ao teu próximo algum serviço ou dar-lhe algum bom conselho, faze-o de bom grado.

3. Guarda-te de manifestar os defeitos alheios, a não ser que grave motivo o exija; mas em tal caso não exageres nunca o que disseres.

4. Não chames a ninguém por alcunhas ou apelidos, nem digas ou faças aos outros o que não quiseras que a ti dissessem ou fizessem.

5. Não ridicularizes os defeitos corporais ou morais de teu próximo, e não os arremedes, o que seria um grande insulto. Amanhã pode muito bem suceder-te aquilo que hoje escarneces em outrem. As mais das vezes, aquelles que zombam dos defeitos alheios são os que mais defeitos têm.

6. Não sejas molesto a ninguém, antes seja teu empenho mostrar-te afável e agradável a todos. A boa educação e a caridade christã mandam suportar os defeitos alheios, perdoar as ofensas a e não desgostar a ninguém, fosse embora nosso inferior.

7. As zombarias e motejos exasperam a pessoa ofendida e são causa de desgosto e discórdias. Mostra mau coração quem aplaude aquelles idiotas os quais, para se mostrarem espirituosos, ofendem ao próximo com ditos picantes.

8. Se procedem mal os que ofendem, nem por isso fazem bem os que se agastam e melindram pelo menor gracejo. O melindroso, o que sempre se ressente, dá mostras de julgar maus os companheiros, e então é elle que se torna mal educado.

9. Evita a soberba que te torna desprezível aos olhos dos homens e odioso perante Deus. A boa educação não é senão a veste da humildade e da caridade. O humilde agrada a todos e é por todos estimado, ao passo que o orgulhoso torna-se antipático e fastidioso. É ás vezes temido, mas nunca querido.

10. No teu porte e nas tuas relações, foge a affectação que é uma falsificação da urbanidade.

11. Aos desconhecidos ou forasteiros não faças perguntas indiscretas a respeito de seu nome, da sua condição ou proveniência.

12. Não dês conselhos a quem t´os não pedir, a não ser que te seja subordinado ou parente, ou tenhas para isso graves motivos.

13. Se receberes algum bom conselho ou fores advertido de algum defeito, deves agradecer sinceramente a quem te usa esta caridade.

14. Sê pródigo com demonstrações de afecto, respeito e cortesia. Uma palavra, um gesto de estima pouco custa, mas vale muito. Foge contudo a adulação que denota ânimo mesquinho e hipócrita, quando não torna suspeitas as tuas intenções.

15. Evita os modos ásperos que usam certos pretenciosos, de modo especial com os dependentes. Estes modos denotam ânimo apoucado e grangeiam antipatias e desprezos. Lembra-te do dito de S. Francisco de Sales : “Apanham-se mais moscas com uma gota de mel, do que com um barril de vinagre”.

16. Não se devem, porém, usar lisonjas e carícias que enervam o caracter e produzem arrogantes e impostores.

17. Demasiada familiaridade para com todos indistintamente é causa reprovável. Respeito e amor para com todos; familiaridades só para com aquelles de quem já recebestes provas de raras virtudes.

V

Deveres para consigo mesmo

1. Regra fundamental para a educação da sociedade é a que nos ensina a ser morigerados e civis para conosco. Se não fores bem educado para contigo, aos poucos contrairás hábitos e maneiras inconvenientes que te será difícil abandonar, e cometerás grosserias perante outros sem perceberes a sua presença, expondo-te á deshonra e á vergonha. Quantos há que desejam parecer bem educados e no entanto não cumprem este preceito!

2. Quem fôr mal educado para consigo, sê-lo-á para com os outros; por isso deves acostumar-te a agir sempre com decoro.

3. Quando ninguém te vê, seja teu procedimento como se todos te vissem. Assim te habituarás a manter-te sempre civil e delicado, não para agradar a outrem, mas pelo sentimento da própria dignidade e pelo amor á decência. Demais, não é verdade que ninguém te vê : vê-te sempre Deus e isto basta.


VI

Procedimento na Egreja

1. A Egreja é a casa de Deus e logar de oração, por isso nela não deves fazer rumor, conversar ou rir, mas expandir os afectos de teu coração para com Deus.

2. Quando entrares na egreja, toma água benta e benze-te. Faze inclinação ao altar se ahi só houver o crucifixo ou uma imagem qualquer; faze genuflexão simples, se houver o SS. Sacramento e genuflexão dupla, se o SS. Estiver exposto.

3. Depois de breve oração, se vieste á egreja para visitá-la, poderás levantar-se e, se não houver nenhuma função, faze tua visita sem perturbar aos outros. Se estiveres com algum companheiro e precisares, poderás trocar com elle algumas palavras, mas em voz baixa, sem leviandade ou gracejo; fica, porém, sempre afastado de quem reza para não o perturbares. Quantos, nestas ocasiões, se mostram frios, irreverentes, indelicados!

4. Nunca te ajoelhes com um joelho só, apoiando-te no outro com o cotovelo. Não te sentes sobre os calcanhares á maneira dos cachorrinhos, nem te deites sobre o espaldar da cadeira da frente, fazendo arco com o corpo.

5. Durante as sagradas funções abstem-te de bocejar, dormir, voltar-te dum para outro lado e ainda mais de cochichar ou rir com os companheiros. Durante a elevação conserva-te de cabeça erguida fitando a hóstia ou o cálice que o sacerdote eleva, e na benção com o SS., inclina-te mediocremente. São estas as últimas prescrições da Egreja.

6. Ouve com atenção as práticas e instruções morais. Não sejas dos que perturbam o pregador e os ouvintes, tossindo, assoando-se, ou fazendo qualquer rumor. Não saias nunca do sermão, sem algum bom pensamento ou máxima de para praticar. Dá grande importância ao estudo da Religião e a sua prática, como fazem os homens verdadeiramente grandes. O grande Joaquim Nabuco, insigne magistrado e literato, não deixava de ajudar á missa, comungar quando podia e rezar todos os dias o seu terço.

7. Tem cuidado em não mover os bancos e as cadeiras ou fazê-los ranger mexendo-te a cada passo.

8. Não cuspas nunca sobre o pavimento porque tal cousa, além de anti-higiênica e incivil, expõe os teus vizinhos ao perigo de se enxovalharem.

9. Sê recolhido mesmo ao sair da egreja. Não te alvorotes para sair primeiro , nem te detenhas a fazer barulho na porta da egreja.

10. Quando cantares os ofícios divinos ou cânticos sagrados, observa as devidas pausas. Não faças dissonâncias de vozes, gritando ou cantando fora de tom ou prolongando os finais dos versículos para fazeres ostentação de tua voz; pensa ao invez que, com o canto, louvas ao Senhor, e que á tua voz fazem eco os anjos do céu.

11. Tua oração seja freqüente e fervorosa, nunca feita de má vontade ou com perturbação dos outros. Quando rezares em comum, não levantes demais a voz, nem tampouco rezes tão baixo que não sejas ouvido. Reza as orações com as devidas pausas e no mesmo tom dos outros.

12. É mau costume o voltar-se para ver quem entra ou quem sai.

13. Se tiveres a ventura de ajudar á missa, procura conhecer e observas com exatidão as cerimônias, especialmente as inclinações e genuflexões.

14. Arremedar as cerimônias eclesiásticas não é gracejo lícito, antes, demonstra má educação e atrai castigos de Deus. Entrar em egrejas de outras religiões, mesmo por amor da arte, deve ser cousa excepcional e nunca em tempo de funções religiosas, para evitar perigos e escândalos.

15. Na egreja não se saúdam amigos nem conhecidos. Em casos excepcionais, fal-o-ás com simples inclinação de cabeça e nunca com aperto de mão.

VII

Procedimento na Aula

Depois da egreja merece especial respeito a aula. Ahi se forma intelectual e moralmente o homem, adquirindo, com os conhecimentos literários e científicos, a nobreza de coração e a força de caracter. Ahi assentam-se as bases da vida futura e da futura condição social; daí depende tua felicidade terrena e quiçá também a eterna. Por isso estuda e pratica a seguintes normas:

1. Entra na aula com modéstia e em silêncio e dirige-te logo ao teu logar, ahi permanecendo. Apenas te levantarás á chegada do professor, em sinal de respeito e veneração.

2. Quando o mestre tardar a chegar, não faças rumor, mas espera-o em silêncio, recordando a lição ou lendo algum bom livro.

3. Procura não chegar tarde á aula. Se por justo motivo tiveres que faltar á aula, avisa previamente o professor, se te fôr possível, e voltando, ante de ires ao teu logar, dá-lhe satisfação da tua ausência.

4. Para evitar o mau exemplo, informa o professor, quando por justo motivo chegares á aula sem estar preparado. Quando por justo motivo não julgares melhor o contrário, será acção louvável accusares de atenção a própria negligência, dispondo-te a receber a devida punição.

5. Durante a explicação guarda-te de cochilar, desenhar figuras, fazer bolinhas de papel, dar mostras de admiração ou, o que é pior, de enfado pela explicação.

6. Não te deves voltar para um e para outro lado, nem mover o corpo á maneira de pêndula, nem debruçar-te sobre a carteira, nem apoiar-te com os cotovelos. Evita sobretudo os atos triviais como resmungar, menear as pernas, bater com os pés no chão, assobiar, falar alto, atirar objectos ao ar, etc. Taes actos, além de causarem desordem, revelam grosseria e insubordinação.

7. Não interrompas a explicação com perguntas inoportunas, e quando interrogado, levanta-te prontamente e responde sem pressa, mas também sem te fazeres esperar. Não fiques encostado ou com as mãos nos bolsos. Quando te esqueceres de alguma passagem da lição não procures sugeridores, nem te ponhas a olhar para o teto.

8. Si durante a aula entrar algum superior ou alguma visita, deves levantar-te em signal de respeito.

9. Ás perguntas do professor deves responder clara e distintamente. Nunca respondas seccamente, “sim, não etc” mas “Sim, senhor; não, senhor professor” etc.

10. Quando reprehendido não respondas com arrogância, tivesses embora carradas de razões; no fim da aula poderás desculpar-se em particular com o professor. Mostra-te humilhado, mas contente de ter sido avisado. Não imites os que se enraivessem, atiram o livro ao chão, abaixam a cabeça sobre a carteia com fúria, actos estes que indicam soberba e má educação.

11. Se fores castigado não digas: que é que eu fiz? Eu não fiz nada, etc. nem te levantes com altivez lançando olhares de desdém ao professor ou sorrindo para os companheiros. Pior ainda, se interrogado responderdes com arrogância ou entre dentes, com semblante carregado ou carrancudo.

12. Não caçoes nunca de quem erra ou pronuncia mal as palavras. É também contra a caridade zombar dos mais atrasados. A inteligência e a memória não são cousas tuas, são de Deus, que, assim como as deu, também as poderia tirar.

13. Não faças garatujas na pedra, não escrevas palavras que possa ofender aos companheiros, não sujes as paredes da casa ou os mapas geográficos, não derrames tinta nem sujes com ela a roupa alheia, não introduzas nos tinteiros bolinhas de papel etc. Todos estes actos denotam grande grosseria.

14. As tarefas ou temas de aulas sejam feitos com empenho, asseio e boa caligrafia; a folha em que se fizer a tarefa deve conservar um pouco de margem á esquerda e estar sempre bem cortada. Temas bem feitos e asseados denotam diligência e aplicação e grangeiam a benevolência dos mestres.

15. Tanto pelo próprio decoro, como pelo respeito devido aos colegas, apresentar-te-ás sempre á aula decentemente vestido e asseado e não levarás brinquedos, figuras, jornais ou cousas semelhantes, cujo menos dano é a distração dos companheiros.

16. Não te movas no logar nem dês sinais de impaciência ou aborrecimento.

17. Tanto na saída, como na entrada evita a desordem e a confusão, esperando em silencio tua vez.

18. Respeita os professores, que sejam da tua classe quer sejam de outras. Dá-lhes mostras de reconhecimento: a gratidão é uma das virtudes que mais ornam a tua edade.

A virtude que de modo especial se inculca aos estudantes é a humildade. Estudante soberbo é synonimo de ignorante.

VIII

Procedimento na sala de estudo

1. Tudo o que se disse quanto ás aulas diga-se também quanto á sala de estudo. Ahi a tua primeira occupação deve consistir em fazer as tarefas e estudar as lições. Nos dias em que te sobrar tempo poderás ocupar-te em alguma leitura útil.

2. Quando escreves, evita de estar recurvado, apoiar o peito á carteira, torcer o pescoço, arregalar os olhos, contrair os lábios, etc. Não estudes em voz alta, pois além de perturbares os vizinhos, prejudicas a tua saúde.

3. Tem cuidado dos livros, cadernos e em geral de tudo o que te pertence. Não façais figuras e borrões nos livros, não os estragues dobrando as extremidades das folhas e marcando-as com tinta ou com a unha.

4. Não toque no que não te pertence. Em caso de necessidade pedil-o-ás com bons modos ao companheiro. Não atires papel ao chão, mas guarda-o no bolso e á saída deposita-o no caixão ou cesto próprio para isto.

5. O logar dos preguiçosos e negligentes distingue-se pela desordem que ahi reina, pelas manchas de tinta e pelo desasseio geral. Distintivo dos negligentes são também as manchas de tinta nas mãos, na roupa e ás vezes até no rosto e no pescoço.

6. Demonstram pouco amor ao estudo aquelles que se voltam ao mínimo rumor, fitam a quem entra ou sai e o acompanham com o olhar para ver aonde vai, o que faz, ou com quem fala.

7. Não têm franqueza e confiança e por isso não merecem o amor dos superiores aquelles que conserva ás ocultas livros, fotografia, figuras, postais etc. e os fazem girar pelas mãos dos companheiros. Estes, desde tenra idade, já mostram ânimo malévolo. De quanto mal são responsáveis perante Deus.


IX

Na mesa

Na mesa mais do que em outro qualquer logar, conhece-se a pessoa bem educada, porque sendo o comer e o beber acções de todo materiais, assemelhar-nos-emos aos brutos, se não usarmos as devidas precauções.

Na verdade, que se há de dizer dos que se curvam sobre o prato, lançam olhares ávidos e irrequietos para esta ou aquela comida ou bebida, devoram, numa palavra, com a boca, com os olhos e com as mãos? Não se podem comparar senão aos brutos. Achando-te pois á mesa, em tua casa ou na alheia e especialmente num jantar de gala, não te descuides de praticar com atenção ao menos as principais regras de civilidade.

1. Antes de te pôres á mesa, tira o sobretudo e depõe o chapéu. Para te sentares espera que o façam os donos da casa; o mesmo observarás quanto ao desdobrar o guardanapo, ao beber, e ao comer.

2. Si os logares estiverem marcados, toma o teu; no caso contrário, espere que o dono da casa t´o indique. Si tivéres liberdade de escolher, escolhe de preferência os ultimos logares, porque é melhor ser convidado a aproximar-se do que a retroceder.

3. Não te mostres descontente do logar que te coube e muito menos dos vizinhos, antes bom fazer-lhe logo no princípio um cumprimento e durante a refeição ser com elles cortez e civil.

4. Á mesa deves ficar bem composto. Não arregaces as mangas como o médico prestes a fazer uma operação; não fiques debruçado por sobre a mesa, nem tampouco muito afastado, não apóies os cotovelos á mesa, mas apenas os pulsos. Não inclines a cabeça a cada bocado: deves levar a comida á boca e não a boca á comida; assim também o guardanapo aos lábios e não vice-versa.

5. O pão parte-se com a mão e leva-se á boca de uma só vez todo o bocado que se partir. As bebidas levam-se á boca com a mão direita. Com a direita deve-se também trinchar e oferecer.

6. O guardanapo deve-se estender sobre os joelhos, Familiarmente tolera-se prendê-lo á roupa pela extremidade.

7. Com o guardanapo só se devem limpar os dedos e os lábios, principalmente antes e depois de beber; e não é lícito enxugar com elle o que quer que seja. É reprovável costume o de enxugar os pratos, os copos e talheres; tal ato mostra que o convidado não se fia da família.

8. A colher segura-se com a mão direita e não com toda, mas com três dedos e com certa elegância. Não se deve introduzir toda a colher na boca, mas só até a metade e pela frente, não de lado.

9. Conforme o uso mais comum, a faca conserva-se na mão direita para cortar a carne e outros sólidos que se levam á boca com o garfo mantido na esquerda.

10. A faca nunca se leva á boca. Quando fôr mister servir-se do prato comum, faça-se com talheres a isso destinados e nunca com os próprios.

11. É cousa reprovável servir-se dos talheres para tamborilar, gesticular etc.

12. Quem serve, deve começar pela pessoa mais digna e passar depois os outros em escala decrescente e sempre á esquerda do convidado. É costume servir pela direita, vinho, café, chá etc. Nas refeições íntimas os próprios comensaes podem-se incumbir de passar os pratos de serviço. Passando ao vizinho um prato, um talher ou outra cousa, deve-se fazer do modo mais cômodo.

13. Sê discreto ao servir-te do prato comum. Toma o que estiver mais á mão e não voltes o prato em todas ad direções para escolher o melhor. Cúmulo de incivilidade seria cheirar as iguarias que se te apresentam. Se por acaso ficares privado de alguma cousa, não dês signal de desgosto, mas mostra-te indiferente e educado.

14. Si te sentares ao lado de uma senhora ou de uma pessoa notável, não só a deverás servir por primeira, mas procura que nada lhe falte e oferece-lhe teus serviços quando perceberes que ela precisa. Isto entende-se para o caso em que não seja o prato de serviço apresentado pelos criados.

15. Nunca toque cousa úmida com as mãos. Só as iguarias enxutas como o pão, o biscoito, algumas frutas etc. podem-se tomar e levar á boca com as mãos.

16. Trinchando, oferecendo ou servindo-te, evita que caia molho sobre a mesa. Se, não obstante, cair algum pedaço de carne ou cousa semelhante, deverás tomá-lo com o garfo e pô-lo num prato á parte. Para evitares, porém, este e semelhantes inconvenientes, deves servir-te com o talher (do prato de serviço) e não entornares ou fazeres deslizar o molho ou as iguarias para o teu prato. Quando colocares o talher na travessa, faze-o com cuidado, para que se não mergulhe no molho.

17. Grande grosseria é tirar alguma cousa do prato comum e levá-la diretamente á boca.

18. Não peças cousa alguma, mas espere que te a ofereçam. Não critiques as iguarias nem dês signal de que te não apetecem. Se depois de te servires de alguma iguaria, não a puderes comer, deixa-a no prato que te será retirado.

19. Olhar com avidez para o que se apresenta á mesa, olhar para a boca dos vizinhos como para querer-lhe contar os bocados são actos de grande grosseria. Quem fôr estranho ou inferior não convide nunca os outros a se servirem; isto não é de sua competência.

20. Tudo quanto puder suscitar repugnância deve-se a todo custo evitar; a saber:

a) Mostrar ao vizinho o que de repugnante se encontrar na comida, como um cabelo, um inseto etc. Em tal caso, chame-se o servente e entregue-se-lhe o prato para que o retire.

b) Projetar da boca para o prato um osso, uma pedrinha, uma espinha de peito etc. Deve-se tirar com a colher ou garbo sempre disfarçadamente, e depositar no prato.

c) Esgravatar os dentes com o garfo ou com as unhas, gorgolhejar com o vinho, café ou outro líquido. Para limpar os dentes servem os palitos. Quando saíres da mesa não leves o palito na boca á maneira dos pássaros quando fazem seus ninhos.

d) Misturar no copo diversas bebidas, ou no prato diversas espécies de comida, a não ser nas refeições de família.

e) Deixar cair da boca os alimentos ou borrifar com elles o vizinho ao falares. Quem tiver este defeito fale pouco e com cuidado. Em nenhum caso, porém se deve falar com a boca cheia.

f) Dar estalos com os lábios e com a língua, como para mostrar que está saborosa a comida.

g) Enxovalhar a roupa ou a toalha, enchendo demais o copo, entornando molho etc. Do copo deve-se encher apenas três quartos, no máximo e nunca esgotá-lo completamente nem escorrupichar as bebidas. É de bom tom deixar sempre algum resíduo de bebida: vinho, café etc.

h) Cheirar a comida e os copos etc. tirar com os dedos alguma cousa que tenha caído no copo.

i) Falar ou beber com a boca cheia, pôr na boca grande quantidade de comida de uma só vez.

j) Comer ás pressas, o que além de incivil é prejudicial á saúde; a primeira digestão faz-se na boca. Evite-se, porém, o excesso oposto.

k) Abrir a boca, mostrando assim o que se mastiga, limpar o prato com o pão, lamber os dedos, enxugar os lábios com as mãos ou com a manga.

l) Virar demasiado o copo na boca deixando impressa a marca dos lábios, ou olhar para os lados enquanto bebe.

m) Respirar, tossir, fazer qualquer rumor no copo, tomar longa respiração depois de beber.

n) Coçar-se, cuspir, tossir, espirrar, tomar rapé ou assoar-se, sem absoluta necessidade.

o) Nem falar muito ou muito alto, como os bêbados, nem tampouco ficar sério e carrancudo como si se estivesse descontente do tratamento. Não se censurem as iguarias e as bebidas, nem se louvem demasiado. Use-se especial cuidado nas conversações, para não sair dos limites da decência e do decoro, para o que de nada vale a fórmula “ com perdão da palavra “.

21. Além destas regras geraes dão-se outras para os diversos alimentos.

Pão – Em geral o pão já se acha cortado em fatias num prato comum, quando não se distribui a cada um dos convivas um pequeno pão que depois será repetido quando fôr preciso.
Toma-se uma dessas fatias de cada vez e não duas ou mais, segurando-a com a esquerda; parte-se um bocado com a direita e, com a mesma leva-se á boca. Se porventura se tiver que cortar o pão na mesa, tomar-se-á com a esquerda e cortar-se-á no ar ou apoiando-o no prato, não sobre a mesa ou sobre o peito.
Não se separe o miolo da crosta para comê-los separadamente; tampouco é lícito esmiuçar o pão para comer os pedacinhos.

Sopa – Se estiver muito quente, pode-se agitar um pouco com a colher, nunca soprando. Não se faça rumor com a colher no fundo do prato e os sorvos devem-se fazer sem estrondo. No fim poder-se-á inclinar um pouquinho prato para recolher o resto.
Enquanto se toma a sopa não se deve beber vinho ou qualquer outra bebida, o que é muito prejudicial aos dentes.
É reprovável encher demasiado o prato, ensopar o pão, principiar um ponto do prato e contorná-lo com a colher, tomar em duas vezes uma só colherada.

Sal – Não se deve tirar o sal com os dedos ou com o cabo da colher ou do garfo. Quando não houver colherinha própria tirar-se-á com a ponta da própria faca, se ainda não tiver sido usada. Em caso contrário pede-se uma ao criado; não o querendo ou não o podendo fazer, coma-se do mesmo modo, ou então deixe-se no prato.

Molho – O molho serve-se com uma colher apropriada e não virando a vasilha no próprio prato.

Carne – A carne, assim como os legumes, come-se com o garfo. Não se toca com as mãos, não se destaca dos ossos com os dentes, mas com a faca e com o garfo. Os ossos de nenhum modo se devem roer ou chupar; não se põem sobre a mesa ou debaixo dela, mas na beira do prato.
A carne pode-se comer de dois modos: cortando-a antes pedacinhos que se levarão á boca com o garfo, ou, o que é mais comum segundo o costume inglês, mantendo na direita a faca com que se cortam vez por vez os pedaços que serão levados á boca com o garfo conservado na esquerda.

Peixe – Tira-se o peixe com a faca ao longo do dorso e, quando estiver servido, com auxílio do garfo separam-se as espinhas.

Manteiga – A manteiga não se estende de uma vez por todo o pão , mas á medida que se parte o pão vai-se-lhe pondo a manteiga, levando-o depois á boca.
Quando a manteiga não fôr servida a cada um dos convivas, deve-se tirar da manteigueira, com a faca que ao lado dela estiver, uma certa quantidade, pô-la á beira do prato e servimo-nos dali.

24. Apresentando-se á mesa uma iguaria que não conheces e não sabes como se come não te deves servir dela. Assim também não acceites a incumbência de trinchar, se não estiveres nisto exercitado, pois qualquer imperícia pode ter graves conseqüências. Não é pois cavalheiroso insistir para que alguém tome tal encargo.

25. Quando fôr tempo de mudar os pratos, deixa que t´os mudem sem cerimônia. Cabe ao servente tirá-los, e não a ti oferecel-os. (Os que retiram os pratos devem fazel-o do lado direito).

26. Se durante a refeição houver leitura, deves escutal-a com atenção e em silêncio, evitando rumor com os talheres ; o mesmo se deve observar se houver canto, música, declamação ou cousa semelhante.

27. Para os brindes os costumes variam conforme os países. Entre nós está prevalecendo a praxe de não se tocarem entre si as taças ao findar o brinde, mas fazerem-se com elas apenas simples acenos á pessoa brindada.

O brinde é uma composição literária completamente distinta das demais. Não é absolutamente um discurso, mas uma simples saudação brevíssima e quanto possível viva e brilhante. A rigor dever-se-ia suspender completamente qualquer movimento para se prestar atenção exclusiva aos brindes e todos os convivas deveriam levar logo a mão às taças, certo de que o orador terminaria em poucos segundos; mas como se poderá isso conciliar com a praxe detestável – que felizmente tende a desaparecer – dos longos discursos á mesa?

O ideal seria abolir de vez os brindes; mas enquanto isso não se conseguir, façam-se poucos, brevíssimos e um tanto espaçados, pela simplicíssima razão de que, quando se emendam muitos brindes, ou hão de os convivas deixar de comer por um certo tempo considerável, ou então, continuando a comer, faltar de consideração para quem fala.

28. A oração antes e depois da comida é uma prática que um christão nunca deveria omitir.

29. Para coroar este capítulo importantíssimo, resta dizer que a primeira e mais importante regra de educação na mesa é a temperança no comer e no beber. Quem come até se empanzinar e bebe até ficar alterado, é indigno de sentar-se á mesa com pessoas educadas. O alimento nos é dado, não para satisfação do apetite, como aos brutos, mas sim para conservarmos são o corpo, instrumento da nossa alma. Não é pois bem entendida a civilidade daquelles que insistem muito com os comensaes para que comam e bebam.

30. Julgo supérfluo acrescentar que se evite o menor estrago de comida: quantos pobres cobiçam os nossos sobejos! A demasiada prodigalidade e o estrago de comida merecem severo castigo de Deus, que ordenou aos seus discípulos recolhessem as migalhas de pão para não se perderem.

31. Um bom christão jamais aceita, em dias de abstinência, convites para refeições, feitos por pessoas que não a observam. Sendo surpreendido em taes refeições, deve-se ter bastante coragem para obedecer às leis da S. egreja. O effeito da tal proceder é sempre a estima dos comensaes sisudos.

32. Enfim, nem todas as regras aqui compreendidas tem sempre o mesmo valor. Em família e no seio das comunidades permitem-se algumas exceções, nunca, porém, em detrimento da cortezia, pois ahi, mais que em qualquer outro logar, deve dominar o afecto que é a norma da cortesia.

X

Ainda sobre o procedimento á mesa

Acrescentamos aqui, como complemento ao capítulo precedente, que é sem dúvida dos mais importantes do compendio, alguns preceitos particulares extraídos dos melhores autores.

Guarda-te de:

1. Fazer sopas de pão dentro da sopa, molho, ou o que quer que seja.

2. Encher o garfo de comida com a faca, para depois o meter na boca. Devemos levar no garfo o que elle pode apanhar com facilidade, e não mais.

3. Pegar no talher desastradamente. Devemos apoiar os cabos da faca e do garfo á palma da mão. A maneira de se manejar graciosamente o talher só se consegue pela prática e observação.

4. Estar com o garfo espetado, á laia de punhal; devemos sempre levar a comida á boca com um movimento curvilíneo ou do garfo ou da colher.

5. Comer e engolir com sofreguidão. Devemos fazê-lo sempre com vagar; comer atabalhoadamente é grosseria.

6. Encher a boca com comida de mais e mastigar ruidosamente.

7. Molhar o pão ou os biscoitos no vinho, café, chá etc. Leva-se o bocado á boca, mastiga-se um tanto e depois toma-se um sorvo de líquido. Esta regra é geral também para qualquer alimento, líquido ou sólido.

8. Alargar os cotovelos, quando se cortam as iguarias. Devemos conservar os cotovelos cingidos ao corpo.

9. Comer com a colher tudo o que pode ser comido com o garfo. Mesmo os gelados são agora freqüentemente comidos com o garfo.

10. Devorar a ultima colher de sopa, o ultimo bocado de pão, a ultima garfada de qualquer iguaria; a limpeza dos pratos não pertence aos convivas.

11. Pedir a repetição de qualquer prato. Devemos esperar que o criado o offereça. No entanto é preferível não repetir cousa alguma.

12. Estender a mão por deante das outras pessoas, na intenção de pegar qualquer cousa que esteja longe de nós.

13. Pedir ao vizinho que nos dê qualquer objecto que não esteja ao nosso alcance. Para isso é que servem os criados. Brincar com o guardanapo, com o copo ou com o garfo, ou com qualquer outro objecto.

14. Limpar a cara ou o queixo com o guardanapo. Devemos somente passá-lo levemente pelos lábios.

15. Voltar as costas a uma pessôa , com o propósito de falar de outra.

16. Conversar por deante da pessôa, que está sentada ao lado.

17. Estar acanhado. Devemos fazer a diligencia por estar á vontade, e têr por nós próprios o respeito que devemos aos outros.

18. Deixar cair a faca ou garfo no chão; caso, porém tal aconteça não devemos ficar atarantados. Dirijamo-nos placidamente ao criado pedindo-lhe que substitua o objecto caído, e não pensemos mais em semelhante ninharia.

19. Preocupar-te com estes pequenos incidentes; devemos deixar passar estas faltas sem comentários, e com filosófica indiferença.

20. Reportrear-te na cadeira. Os Romanos reclinavam-se em leitos, junto da mesa, mas a moderna civilização não o permite.

21. Debruçar-te sobre a mesa.

22. Usar palito á mesa sem grande necessidade; caso nos sirvamos delle, devemos cobrir a boca com uma das mãos, emquanto tiramos dos dentes o que nos incomoda.

23. Comer cebola ou alho, quando esperares visitas; devemos guardar as comidas com taes adubos para quando jantamos sozinhos e tencionamos ficar sós algumas horas depois de jantar. Não é agradável manifestar pelo olfato quaes foram as nossas refeições. Para o cheiro da cebola ou do alho é eficaz, no entanto, um copo de leite tomado logo a seguir.

24. Teimar com um convidado para que coma. Antigamente isto era costume, e era também considerado delicadeza da parte do convidado aceitar ou desculpar-se por se ver forçado a recusar. Maçar um conviva com offerecimentos contínuos é, presentemente, considerado mau gosto.

25. Como convidado, dobrar o guardanapo quando acabares de jantar. Basta que o ponhas de lado.

26. Ao recusar, um prato, dares como razão “que pode fazer mal” ou “que não gostas”. Basta recusar simplesmente, e ninguem tem o direito de perguntar porque.

27. Fazer a mais leve alusão a dispepsia, indigestão ou incomodos semelhantes. A digestão é um assumpto, muito intimo que fica só para nós.

28. Fazer notar, como conselho de amizade, que uma certa vianda é indigesta ou prejudicial a qualquer doença, etc. Não é delicado metermo-nos na vida alheia, e naturalmente a pessôa a quem nos dirigimos está muito mais apta do que nós para saber o que lhe faz mal ou bem.

29. Mostrar uma correcção de maneiras demasiado affectada; devemos ser naturaes na nossa delicadeza. Mais vale cometter leves faltas, que mostrar esforço para não as cometter.

30. Agradecer ao dono ou dona da casa o jantar para o qual fostes convidado; devemos somente á sahida expressar o prazer que sentimos com o convite.

31. Mastigar a comida com a boca aberta.

32. Assobiar ou cantar quando estiveres á mesa.

33. Beber pelo pires. No entanto, se esta grosseria ou outra qualquer fôr comitida por outra pessôa , não devemos fazê-la notar.

34. Meter a colhér na chávena de chá ou de café enquanto te servirem; este costume faz que muitas vezes se entorne a chávena. Devemos deixar ficar a colhér no pires.

35. Cortar o pão ás fatías; é preferível partir o pão á mão, em bocadinhos, e em seguida barrá-los de manteiga.

36. Quebrar um ovo quente na borda da chávena ou cópo. Quando ha algum recipiente adequado faz-se na extremidade do ovo uma abertura sufficiente e esvasia-se a casca. Em caso contrário deve-se comer na casca, abrindo a parte superior do ovo como se fosse uma tampa.

37. Levantarmo-nos da mesa antes de acabar a refeição.

38. Ler jornaes ou livros á mesa, quando haja outros convívas.

39. Deixar caír pingos de café, vinho etc., ou deitar nódoas de gordura no fato. Basta um certo cuidado para evitar estes incidentes.

XI

Da conversação

Nosso Senhor na sua bondade deu-nos um instrumento que nos serve ao mesmo tempo de recreio, de repouso, de rehabilitação do espírito abatido pelas lutas da vida, e de escola de conhecimentos úteis: é a conversação. Quando nos sentimos cançados, nosso espirito busca o descanço no seio dos amigos; acabrunhados, nosso coração verte no coração amigo as suas magoas e attinge conforto e coragem. Cumpre-nos, pois, dever sagrado de não convertermos instrumento tão salutar em veneno e perdição.

Muitas são as regras de civilidade que nos cabe praticar, para que a nossa conversação se torne atrahente, instructiva e moral.

1. Teu porte deve ser correcto e nobre, quer estejas sentado quer de pé. Deves, quanto possivel, collocar-te deante das pessoas com quem conversas, para poderes perceber a impressão que tuas palavras produzem, evitando porém o fitar demasiado algum interlocutor.

2. Tem cuidado em não falar muito proximo das pessoas que te rodeiam, de modo que te sintam o halito ou sejam alvejadas por algum perdigoto.

3. Evita contrahir os labios, enrugar a fronte, mostrar os dentes, fazer tregeitos ou gestos exagerados. Foge a affectação na pronuncia e na toada da voz, o habito de gaguejar, de truncar as palavras ou syllabas, cousas estas que causam enfado aos ouvintes.

4. Não fales muito alto de modo que tuas palavras degenerem em gritos, nem por demais baixo que não te possam ouvir todos. A voz deve ser modulada segundo os logares, o assumpto e o numero de ouvintes.

5. Evita falar fanhoso, cantarolar, declamar, repetir muitas vezes a mesma palavra por sestro. Não abuses das palavras exageradas e hyperbolicas, como: magnífico, esplendido, extraordinário, maravilho, etc. como também das palavra extrangeiras, o que além de tudo, indica ostentação. Sê parco no uso dos superlativos. Ao bello chamarás bello e não perfeito; ao feio chamarás feio e não horrivel. A exageração faz com que muitas pessoas deixem de ser acreditadas.

6. Evita as expressões pouco honestas e decentes e as palavras offensivas. O habito de dizer certas cousas, taes quaes são, abertamente e sem véo, não se allia á correcção dos costumes e á caridade.

7. Por assumpto das tuas conversas, nunca tomes cousas triviaes e frívolas ou demasiado conhecidas, nem tão pouco sublimes e pindaricas ou melancolicas e tristes. Deves evitar, quanto é possivel, falar de ti mesmo e, sendo necessário, faze-o em poucas palavras e ás pressas. O eu nas conversações é um estribilho muito desagradavel ao ouvido. Guarda-te sobretudo de mostrar desejos que te louvem, o que poderia produzir o effeito opposto.

8. Não comeces a contar cousas que não conheces bem, para não te arriscares a ter que interromper no meio a tua narração.

9. A satyra é com razão chamada uma das sete armas do demonio. Ella não convém á conversação na qual tudo deve ser amizade. Um satyrico será temido, mas nunca amado. Peior ainda acontece com os maldizentes e detractores e com os que os applaudem.

10. É louvavel entremear na conversa algum gracejo que mantenha alegre a companhia, quando isso se fizer com espontaneidade, graça e innocencia.

11. Não arremedes a voz e as maneiras d´este ou d´aquelle, nem ridicularises os outros. Os gracejos e ditos chistosos são permitidos com os familiares e inferiores, mas no justo limite. Se o companheiro a quem são dirigidos os gracejos, se resentir, será necessario truncal-os immediatamente; caçoadas que desagradam e offendem ao proximo são contrarias á caridade.

12. Percebendo que tua narração redunda em murmuração, é teu dever truncal-a, fosse embora attrahente. Si ouvires algum companheiro criticar as acções de outrem, embora ausente, procura com bons modos advertil-o.

14. Si estiveres em numerosa companhia, não deverás falar a um só ou de cousas que interessem a ti e a elle. Procura falar a todos e de cousas que a todos agradem. Não fales das afflições pessoaes ou das dôres da família, sem seres interrogado. Os choramingas são de peso aos outros. É preciso sabermos supportar a nossa cruz como fortes e só confiarmos nossas magoas aos que nos são caros.

15. Para que a conversação se torne amena e corrente, não é mistér contar muitas cousas a um tempo, fazer muitos preambulos e digressões; a confusão cança e aborrece.

16. Procura evitar os sestros, isto é, o habito de repetir certos gestos e principalmente certas palavras, como: não é? Sabe? Já viu? supponhamos, etc. O que tiver taes sestros difficilmente os percebe, não assim os ouvintes que se sentem logo maçados.

17. Evita os litígios. Si alguem te contradisser ou mesmo te offender, reprime teus impetos e sê generoso. Palavras pesadas não convencem o adversario, antes o exasperam, prejudicam a tua reputação perante os outros, e fazem-lhes perder o gosto pela conversação.

18. Se houver alterações em tua presença, não procures atirar tambem tu a tua pedra; procura ao envez dar novo rumo á conversa.

19. As discussões, embora fôra para desejar que não as houvesse, todavia têm não raro as suas vantagens. Acostumam a usar mais exactidão nas expressões, a communicarem-se reciprocamente as luzes intellectuaes; dão vida e movimento á sociedade. Cumpre porém evitar toda a questão religiosa e politica. Taes gêneros de discussão têm em geral como resultado scenas desagradaveis.

20. Se alguém em tua presença sustentar uma opinião que não te parecer exacta, ou mesmo tiveres provas de que é erronea, não lhe dirás: não é verdade – é mentira etc. mas procurarás adoçar a contradicção: perdoe-me se não sou do seu parecer – julgo que não é exacto – talvez o senhor não esteja bem informado etc.

21. É molesto quem teima na propria opinião, como se a verdade lhe fosse previlegio pessoal. A firmeza nas próprias convicções é virtude; não assim a obstinação em querer ter razão a todo custo. Pretender impor as próprias opiniões, enfurecendo-se e vociferando, é proprio dos loucos. Ordinariamente quem tem menos razão é quem mais grita, procurando suppir d´este modo á insufficiencia dos seus argumentos. As palavras offensivas então, nunca foram nem serão argumento convincente.

22. Os jovens não devem discutir com os mais velhos nem os inferiores com os superiores, a não ser que recebem para isto auctorisação; ainda assim devem apresentar escusas.

23. Seja tua conversação delicada e conscienciosa. Deus te guarde de falares contra a Egreja e suas instituições, contra o Papa, os Bispos, os Sacerdotes, os Religiosos, etc.

24. Não mutiles nem adultéres o sentido dos textos sagrados. Evita tambem exclamar a todo instante: Meu Deus! Virgem Maria! Valha-me Deus! Jesus! Etc., o que é proibido pelo próprio Deus no mandamento: “Não pronnuciarás o nome de Deus em vão.”

25. Foge e abomina os discursos immoraes ou mesmo só inconvenientes, que poderiam ferir um ouvido innocente e puro e despertar-lhe sentimentos e imagens perigosas. Um jovem christão nunca será por demais mortificado. Longe de ti pois, toda a palavra obscena ou ambigua, toda a historia ou anedocta escandalosa e qualquer referencia leviana a pessôas de diverso sexo. Tudo isto denota corrupção e produz ás vezes notaveis damnos moraes.

26. As imprecações e as expressões que se lhes assemelham, como: Diabo!, co´os demonios!; mal raios te partam! etc. são cousas que nem gracejando se permitem.

27. As expressões baixas e triviaes que se referem ás necessidades naturaes do homem e cousas semelhantes, jamais se deveriam ouvir da bocca de pessôas que se prézam. Todavia é ridiculo o extremo opposto, isto é, fazer rodeios e mais rodeios para dizer uma cousa aliás simples, que, com a devida licença dos ouvintes e sendo necessario, poder-se-ia dizer sem temor.

28. Teu falar seja discreto e prudente: estas são qualidades de um coração bem formado. Não revéles os segredos que te foram confiados, a não ser que o devas fazer por motivo de consciencia. Não recordes antecedentes desagradáveis da vida de algum dos presentes, como seria uma falta, um engano, um parecer etc.

29. Sê ainda mais prudente e retrahido com pessôas desconhecidas, doutra sorte poderias comprometer-te, offender a alguem e grangear inimizades.

30. Não se prézes de saber muitos segredos fazendo disto ostentação; sei muita cousa ... se eu quizesse falar ... não é esta a occasião propria, se não ...; taes expressões offendem aos presentes, mostrando-lhes desconfiança.

31. Não faças perguntas indiscretas para saber segredos de outrem. Não peças a qualquer pessôa noticias de uma familia, dos seus bens, da sua vida etc. o que poderia offender gravemente.

32. Não procures escutar o que outros dizem em vóz baixa, seria até bom afastar-te. Não refiras a outrem o que ouviste d´elle em conversa, a não ser que se tratasse de cousa de pouca importancia ou de impedir a offensa de Deus, ou outro grave inconveniente.

33. Finalmente sê reservado na conversação ou, em outros termos, não fales demais. Alguns ha que querem sempre ter a palavra, como si fossem oradores officiaes; a conversa d´estes palradores torna-se enfadonha. A Sagrada Escriptura diz que no muito falar nunca falta o pecado. O grande tragico Racine revelou um dia a seu filho o segredo do attractivo da sua conversação: Eu não falo muito e procuro fazer sobresahir mais o espirito dos outros do que o meu. Deu-nos o Senhor dois ouvidos e uma só bôcca, para que falassemos pouco e ouvissemos muito.

34. Tampouco deves ficar mudo ou amuado quando todos falam. Teu silencio poderia ser tido por orgulho, antipathia ou desconfiança.

35. Alguns ha que sempre falam de si, das suas façanhas da sua casa etc. e nunca se cançam de narrar o que viram, o que fizeram e o que pretendem fazer e ver. Este genero de vaidade affasta a sympathia dos ouvintes; e no entanto, quantos ha que se acham atacados por esta doença! Não sejas desse numero.

36. Evita falar dos defeitos physicos, da cor, do semblante, dos cabellos, da pronuncia, do andar, numa palavra, do exterior do proximo. Evita sobretudo ridicularizar-lhe o nome, a familia, a profissão, a patria etc. Todos, em geral, somos por demais sensiveis nestes assumptos e não podemos admittir que nos toquem nessas fibras. Assim também nunca deves falar de uma corporação relígiosa, de um Estado, de uma familia, e especialmente dos finados.

37. Ha pessôas, e infelizmente não poucas, que não percebem a parte boa e louvavel de uma cousa e os dotes estimaveis de uma pessôa, ao passo que nada de reprovavel e defeituoso lhes escapa. Procurando com arte diabolica evidenciar os defeitos embora minimos. Esses assemelham-se ao gallo da fabula, que habituado a ciscar nos monturos e alimentar-se de immundicies, não soube apreciar as perolas.

38. Esta mania de criticar mostra não só a falta de educação, mas sentimentos ignobeis e caracter baixo. Lembrem-n´o especialmente os inferiores e estudantes, habituados a censurar e pôr em ridiculo tudo quanto dizem ou fazem os seus superiores! A insolencia delles offende a caridade, corrompe o animo dos ouvintes, fomenta a rebellião e amargura-lhes a existencia.

39. Sejam prudentes os que devem corrigir ou admoestar. Sua primeira qualidade é o imperio de si mesmos; não admoestem nem castiguem emquanto estiverem alterados, e não o façam em presença de outrem, a não ser que se trate de falta grave commetida publicamente. Na calma a voz da razão é mais facilmente escutada. A moderação no corrigir é signal de muito dominio de si mesmo. As pilulas adoçam-se para mais facilmente se puderem engulir, assim á correcção cumpre acrescentar sempre uma palavra de affecto e benevolencia.

40. Passando agora das palvras ás acções procura não fazer em companhia de outrem cousa alguma menos decente e civil. Por isso evita:

a) Cortar ou roer as unhas, coçar-te, metter os dedos na bocca, no nariz, nos ouvidos etc.

b) Tossir e espirrar em frente dos outros, cuspir, assobiar, cantarolar, esfregar corpos ásperos.

c) Falar ao ouvido de alguem sem pedir licença aos presentes, avizinhar-te dos que falam em voz baixa ou contam dinheiro, voltar as costas ou passar por deante de alguem sem te desculpares.

d) Abraçar, fazer cócegas nos outros, chamar alguem de longe; quando fôr preciso falar a uma pessoa que estiver longe, pedirás licença aos presentes.

e) É mau costume chamar uma pessoa pelo nome onde se acha muita gente, como nas ruas, nas estações etc. Póde não ser conveniente tornar o outro conhecido.

f) Espreguiçar-te, estalar os dedos, inchar as bochechas e soprar, esfregar as mãos e bater a cada passo com os pés.

g) Deves tambem evitar de bocejar, o que indica aborrecimento; quando não puderes conter o bocejo, ampara a boca com o lenço ou com a mão aberta, boceja sem rumor e interrompe-te se estavas falando.

h) Quando não puderes reter o espirro procura valer-te do lenço ou, quando não haja tempo, da mão, voltando o rosto para o lado. Cahiu em dedesuso saudar ao espirro de alguem, estando banidas as expressões: Saúde, Deus o ajude etc.

i) Rir muito e por cousa de nada, como fazem os tolos, dar gargalhadas estrondosas que interrompam os outros e os enfadem. Não só o riso deve ser moderado, mas tambem os outros signaes de alegria, de desprazer, de maravilha etc.

41. Requer a cortezia que quando alguem fala, sigas com interesse a conversa e não te occupes em outras cousas, como ler, escrever, esfolhear livros, olhar o relogio, trocar signaes, rir, gracejar, interromper quem fala com outros, introduzindo outros assumptos. Em alguns casos porém é licito e até necessario, com a devida permissão, interromper quem fala, para fazer alguma observação ou uma aprovação ou perguntar alguma cousa que se não comprehendeu bem. Para truncar um discurso indecente ou impio, o superior, e na falta deste, qualquer pessoa, está obrigada a interompel-o.

42. Quando numa conversação se tiver que entregar alguma cousa a um dos presentes, não se estenda a mão por deante dos outros, mas entregue-se por detrás. Se houver algum impedimento então se pedirá licença antes de passal-o pela frente.

43. Estando de pé, conserva o corpo direito; sentado, não estires ou cruzes as pernas. Balançar-se, estirar-se, apoiar-se aos cotovelos são modos inconvenientes. Quando te levantares não te espreguices, não suspires, nem soltes exclamações que indiquem cançaço.

44. Lembra-te emfim que da conversação depende a estima ou o desamor que te dispensarão os companheiros.

XII

Ainda sobre a conversação

Guarda-te de:

1. Emquanto estiveres falando ou ouvindo qualquer pessôa, brincar com a cadeia do relogio. Este costume, alías muito vulgar, é de gôsto duvidoso.

2. Mostrar arrogancia aos inferiores e humildade e adulação aos superiores. Com estes últimos devemos ser dignos, com os primeiros devemos ter em consideração os seus sentimentos, por ínfima que seja a sua categoria.

3. Apresentar senhoras a homens; os homens, por mais elevada que seja a sua posição, devem sêr sempre apresentados ás senhoras. Os homens novos apresentam-se aos de idade; com as senhoras sugere-se o mesmo systema.

4. Mexer nas pessôas quando fallamos com ellas, agarrar-lhes nos braços e nos hombros, ou sacudi-las, para lhes chamar a attenção.

5. Falar mais alto do que os outros, ou tentar monopolizar a conversa.

6. Falar com uma pessôa, tendo outra de permeio.

7. Repetir os escandalos ou historias maliciosas que andam em voga.

8. Discutir pessôas de reputação equivoca, ou tocar em assumptos de discutivel decoro.

9. Quando expuzeres qualquer facto, exagerar até á mentira. Falar a verdade é uma questão de habito. Se poucas pessoas mentem por má intenção, a maior parte da gente torna-se falsa pela mania do exagero.

10. Estar sempre á espreita de ocasião para dizer facécias. Principalmente os homens tornam-se muito ridiculos com a mania de dizer chalaças que incommodam quem as ouve.

11. Quando perguntarem qual é a tua opinião a respeiro de alguem, dal-a com precipitação, sem medir as consequencias que podem resultar, caso repitam a essa pessoa o que disseres.

12. Se tiveres habilidade para imitações, estares sempre pronto para as exhibir em sociedade. Poucas pessoas gostam de ver os seus defeitos ridicularizados; e, mesmo que essas pessoas não estejam presentes, ha sempre um amigo mal intencionado, que lhes faz chegar aos ouvidos que fulano fez um admirável arremedo da sua pessoa, em tal jantar, ou reunião.

13. Responder por monossilabos a qualquer observação que nos fazem.

14. Ouvir com indiferença ou impaciencia o que os outros dizem. Devemos ouvir delicadamente toda a gente; é este um sinal de boa educação, que é necessario cultivar.

15. Estares sempre disposto a depreciar os outros ou a achal-os em falta constantemente. Se os elogios contínuos aborrecem, a censura a todos os actos alheios é igualmente muito irritante.

16. Não seres atenciosos com as pessoas de idade. A gente nova muitas vezes desdenha escandalosamente dos velhos, especialmente se são surdos ou padecem de qualquer outra enfermidade. Não ha nada mais delicado e que melhor mostre a bondade de um coração, do que as solicitas atenções, que se prodigalizam ás pessoas idosas.

17. Ralhar com as crianças ou com criados, deante de outras pessôas.

18. Como dono ou dona de casa, dares as ordens de uma maneira autoritária. Se as dermos com brandura, abedecer-nos-ao de melhor vontade.

19. Aborrecer as outras pessoas, dando-lhes parte das tuas sensaborias domesticas , como questões com criados, ou queixas do mesmo jaez.

20. Atormentar crianças, gatos e cães com brincadeiras grosseiras, que são sómente prova de pouco siso, e aborrecem a quem está presente.

21. Dizer mal de alguem que concorra contigo na mesma profissão ou no mesmo negocio. Devemos ter o orgulho e o respeito de nós mesmos suficiente para apreciar os meritos de um rival, em logar de os depreciar.

22. Julgar que, porque somos idosos nos é permitido usar uma linguagem menos delicada, ou fazer insinuações que causam embaraço ás pessoas novas. O espirito, assim como o bom vinho, deve até tornar-se mais puro e refinado com a idade.

23. Orgulhar-te por falares com demasiada franqueza, o que quasi sempre equivale a grosseria.

24. Fazer muitas perguntas a seguir, e insistir quando percebemos uma certa relutancia na resposta. Pode, por motivos desconhecidos para nós, sêr penoso ou desagradavel ao nosso interlocutor falar nesse assumpto.

XIII

Dos recreios

O recreio é tão necessário ao descanço do corpo como ao allivio do espirito. Homens os mais austeros e virtuosos não só o permitiram, mas o recomendaram. Nos institutos de educação os jogos e exercicios ao ar livre são de verdadeira necessidade; nestes jogos é que deve consistir o recreio de taes institutos. Para maior vantagem, porém, destes recreios cumpre conhecer e observar algumas regras.

1. A recreação não seja demasiado longa nem breve demais; no primeiro caso, tornar-se-ia damnosa moralmente, no segundo, physicamente prejudicial.

2. Deve sempre ser alegre e tranquilla. Por isso evita, com a máxima cautella, os litigios, as brigas, as grosserias, os gritos e algazarras, as desordens de qualquer genero, como tambem a tristeza, a melancolia e o afastamento dos outros.

3. Prefere os brinquedos em que entre em jogo o movimento e abandona os em que seja preciso ficar parado, usar indelicadamente das mãos ou qualquer outra cousa contraria á bôa educação.

4. Seja qual fôr o brinquedo, não te mostres tão apegado a elle de modo a não quereres ceder o logar o outro, quando convier, nem tão reservado que não queiras tomar parte nelle, embora te convidem.

5. Não te excites demais no jogo por capricho ou ancia de ganhar; nem tampouco estejas distrahido e desinteressado, causando assim tédio aos companheiros.

6. É mau costume o zangar-se quando se perde, queixar-se dos collegas, attribuir-lhes o malogro, repetindo a cada momento os erros commettidos; quando muito, é permittido advertil-os com bons modos e quasi sorrindo.

7. Não mostres alegria pueril nem te gabes si sahires vencedor; a modéstia, mesmo nos jogos é signal de coração bem formado.

8. Trapacear no jogo é cousa reprovavel por ser contrária á civilidade e á caridade. Quem não é leal nos brinquedos, difficilmente o será em outras cousas.

9. Quem assiste ao brinquedo não se deve mostrar partidario, dar apartes ou, peior ainda, caçoar dos que brincam mal. Isto incommoda aos jogadores e ás vezes origina rixas.

10. Em caso de discussão, expõe com bons modos a tua opinião ou as tuas razões. Si o adversario não quizer reconhecer o teu direito, será melhor ceder, para que não se offenda a caridade.

11. Não faças da discussão uma rixa vergonhosa usando palavras de monospreso, como besta, estupido, animal, etc.; mostrar-te-ias com tal proceder summamente grosseiro e incivil. Quem emprega as mãos como argumento decisido, mostra-se peior que os brutos, que não possuem razão.

12. Pôr as mãos encima dos companheiros, estar abraçados ou de mãos dadas, atirar pedras ou agua, dar murros e pontapés como os garotos da rua, e outras cousas que não convem enmumerar, são actos da maior grosseria.

13. É diabolico o costume de provocar ira dos outros, quer com palavras pungentes, apellidos e zombarias, quer com actos contra a caridade. Peior ainda seria chamar outros para gosarem da exasperação dos companheiros. Taes modos são tão incivís que não quadram nem na classe mais vil e abjecta.

14. Si por ventura fores tu o alvo de taes grosserias, não sejas propenso a queixar-te e procurar vingança. Interpreta-as benignamente e procura soffrer estes pequenos desgostos, ou então rebatel-os com palavras amaveis, que ás vezes para melhor effeito poderão ter o seu quê de chistosas.

15. As conversações que se mantém durante o recreio, devem ser communs; por isso será grande falta de cortesia excluir quem quer que seja, dando á conversa apparencia de segredo.

16. Não freqüentes sempre os mesmos companheiros formando grupinhos em que muito facil será descambar a conversa para a murmuração, leviandade e até mesmo para a immoralidade. É esta sem duvida uma das peiores pragas dos collegios.

17. Parar a conversação, ou mudar de assumpto ao aproximar-se o superior equivale a condemnar-se por si mesmo, fazendo crer que se diz em cousas que não se deveriam dizer.

18. Procurar companheiro doutras divisões, fugir a presença dos superiores, aproveitar-se de suas distracções, illudir-lhes a vigilância, sahir do logar de recreio sem a devida permissão, são cousas que suscitam juizos desfavoraveis a respeito de quem as commette e dão logar a justas suspeitas e consequencias graves.

19. Procedem mal os que se reunem para fazer algazarra, dar gritos prolongados á maneira de vaia; estes tomam pouco a pouco os instinctos do vulgacho e tendem a ser cidadãos insolentes e revoltósos.

20. Si algum superior jogar comtigo e tu venceres a partida, usa a delicadeza de não te exaltares, attribuindo-o antes a uma casualidade; e seja isso em signal de respeito e estima par com quem se faz pequeno contigo.

21. Seja onde fôr o recreio, procura que não haja estragos de especie alguma por tua parte. Portanto se fôr dentro de casa, não arrastes as cadeiras e as mezas, não quebres louças, não batas com as janellas e portas; se no jardim, repeita as flores, as plantas, as ferramentas etc.; se no pateo, não estragues paredes, portas, arvores, mettendo pregos, riscando, arranhando, escrevendo, etc. Usa especial cuidado em não enxovalhares a roupa dos teus companheiros e tua propria.

XIV


Do proceder fora de casa

Nos passeios e em geral fora de casa, exige-se um comportamento mais correcto e civil do que no seio da família ou do collegio. Assim é que teu modo de vestir e de andar, tuas palavras e teus actos devem revestir mais seriedade e attenção; os proprios companheiros devem ser convenientes á tua condição.

1. Teu traje seja adaptado á tua edade, aceiado e bem arranjado.

2.Teu traje seja moderado e correcto. Agitar os braços ou cruzal-os ao peito, inclinar a cabeça para frente ou para os lados, empinar o peito, requebrar-se, andar aos pulinhos, pôr as mãos nos quadrís ou nos bolsos, encarar as pessoas e os edificios, voltar-se para traz etc., são actos que parecem muito mal numa pessoa que se preza de bem educada.

3. Não deves correr pelas ruas, mórmante si forem muito freqüentadas, mas tão pouco andes muito devagar. Não batas com os pés no chão nem os arrastes á maneira de velhos e rheumaticos.

4. Levando bengala ou guarda-sól não o ponhas ás costas como faz o soldado com a carabina, não os faças girar, não apontes com elle, nem batas em tudo o que encontrares.

5. São incivís os que assobiam ou cantam pelas ruas, atiram pedras, tocam as campainhas das casas, param a observar-lhes o interior, dão encontrões nos que passam etc.

6. Devendo falar com alguem, não pares no meio da rua mas sim proximo á parede e por pouco tempo. Não incommodes nenhum dos transeuntes e si o fizeres sem perceber, pede-lhe desculpa; si fores tu o incommodado, guarda-te de fazer questão e segue o teu caminho.

7. Quando alguem vier na tua direcção, cede-lhe o passo pela esquerda retirando-te para a direita; si porem o outro não conhecer esta regra e não fizér outro tanto, deixa-o passar por onde quizer e evita questões. Nas esquinas procura evitar qualquer encontrão.

Quem caminha na rua rente ás paredes das casas, tendo-as á mão direita, conserva a sua direcção; os que vêm em direcção opposta é que se devem desviar. Quando sahires em companhia de algum superior, ou pessoa distincta, dá-lhe sempre a direira, menos quando andares pelos passeios ou calçadas junto ás paredes, caso em que lhes deves dar o lado da parede, embora fiques tu á direira. A razão desta regra é que, sendo lado da parede mais resguardado de encontrões, salpicos de lama dos vehiculos etc. consedera-se como mais nobre e preferivel.

8. Evita os ajuntamentos, donde em geral se sahe maltratado. Achando-te cercado procura abrir caminho gentilmente. Não é civil deter-se a ver charlatães e a tomar parte nas diversões do vulgo.

9. Se te encontares em logares lamacentos, não imites a estravagancia dos que, de proposito, mettem os pés na agua. Procura o mais possível não enxovalhar a roupa e o calçado.

10. Caminhando com algum companheiro, não te apóies a elle nem lhe dês econtrões. Em conversa não fales demasiado alto de forma que te ouçam os estranhos; portanto evita a todo o custo as dicussões e, uma vez surgidas, interrompe-as promptamente. Não te rias exageradamente, que poderias ser tido por maluco ou bebado.

11. Passeando em numero de tres, darás o centro á pessoa mais digna. Quando houver mais de tres , a practica mostrará o critério a seguir. Devem porém, sempre occupar os logares do centro as pessoas mais dignas.

12. Não sejas avaro de saudações, mas tira o chapéo a quem t´o tira, e tira-o por primeiro aos superiores. Saúda tambem aos que saudarem os teus companheiros.

13. Se um estranho te pedir alguma informação, satisfaze-o gentilmente, deixando-lhe além da gratidão, uma impressão agradável, e de modo especial se fôr um estranho.

14. Se o teu companheiro se detiver a falar com outrem de assumpto que não te diz respeito, afasta-te um tanto para não te mostrares curioso. Isto farás sempre e em qualquer logar.

15. Fitar uma pessôa, especialmente se fôr desconhecida; observar-lhe os gestos, os passos, o vestuario e adornos, são actos reprovaveis, principalmente nos jovens, que devem ser espelhos de modestia.

16. Malcreado e immerecedor da estima universal se mostraria quem ousasse proferir graçolas indecentes ou contrarias á religião.

17. Nunca te recuses ao passeio prescripto, pois que este é um exercício utilissimo á saude. Procura achar-te prompto á hora da sahida sem te fazeres esperar.

18. Tem cuidado em sahir de casa bem asseiado e com as botinas engraxadas. Vê que te não falte a gravata e o collarinho. Obedece de bom grado ao guia do passeio e mostra-te satisfeito do logar para onde elle se dirigir.

19. Por toda parte encontram-te os olhares dos transeuntes; é preciso, pois, para edificação delles, que sejas reservado nos olhares, nas palavras e nas acções, composto na pessôa, grave no andar. O descuido, a negligencia neste ponto poderia trazer vergonha aos que te acompanham.

20. Guarda a devida distancia entre os companheiro, a qual não deve ser demasiado grande para que não se interponham ou atravessem pessôas extranhas, nem por demais pequena que corras perigo de pisar os companheiros.

21. Lembrem-se todos que o passeio não é uma corrida; todavia guardem-se de cahir no extremo opposto. Seria louvavel uniformares o passo, ao menos com os que tiveres ao lado.

22. Não dirijas a palavra aos da outra fila, nem caminhes tão distraido e absorto que vas de encontro aos que que passam e ás arvores, ou cáias em algum fosso.

23. Si todos falarem em altas vozes a comitiva parecerá um bando de papagaios.

24. Evita com todo o cuidado deter-te a examinar os objectos nas vitrinas, as figuras, os reclames etc. Emfim não chames a attenção dos companheiro para taes cousas, tanto menos apontando-lhes com o dedo.


XV

Ainda sobre o procedimento fóra de casa

Guarda-te de:

1. Roçar-te pelas outras pessoas, acotovelal-as, ou mostrar de algum modo que lhe não dás consideração.

2. Não pedir desculpa, todas as vezes que pisares alguem, ou com alguem tropeçares, ou por qualquer fórma incomodares os outros.

3. Apontar para pessoas ou objectos.

4. Trazer a bengala ou guarda-chuva em posição horizontal. Este mau habito tem causado já accidentes bem serios, especialmente ás crianças, cujos olhos ficam á altura da ponteira.

5. Ficares parado nas esquinas ou nas portas das lojas, a olhar para quem passa. É um habito insolente e frívolo.

6. Fazer parar as pessoas conhecidas no meio dos passeios, impedindo o transito aos outros. Quando succede encontrarmo-nos com alguem, a quem desejamos falar, devemos desviar-nos para um dos lados do passeio.

7. Parar nas plataformas dos carros publicos ou ás portas dos vagões dos caminhos de ferro, nas estações, estorvando, assim, a entrada ou sahida dos outros passageiros. Lembremo-nos sempre dos direitos e conveniencias alheias.

8. Fazeres parar as senhoras, tuas conhecidas, na rua, quando lhes desejar falar. Devemos seguir um momento á direita dellas, e, ao despedirmo-nos, tirar sempre o chapéu.

9. Da pressa em fazeres apresentações. Devemos primeiro certificar-nos se as pessoas desejam ser apresentadas umas ás outras.

10. Durante um passeio, apresentar a pessoa que te acompanha a todas as pessoas do teu conhecimento, que encontrares na rua. As apresentações, feitas na rua, raras vezes tem consequencias.

11. Fazer parar uma pessoa conhecida, que anda a tratar dos seus negocios, excepto se tiveres qualquer outra cousa importante a comunicar-lhe.

12. Para alcançar logar num carro ou divertimento publico qualquer, empurrares as mulheres e as crianças, os homens mais idosos ou mais fracos. Se numa ocasião dessas, em consequencia duma delicada concessão, um homem perder o seu logar, deve ficar com a consolação de valer mais que os outros.

13. Ocupar mais espaço do que o permitido num carro publico, ou vagão de caminho de ferro.

14. Mentir, asseverando que não ha logar, com o proposito de desviar a concorrencia dos outros e de ficar mais á vontade.

15. Entrar num theatro ou concerto depois do espectaculo estar começado e desse modo incommodar os outros. Devemos chegar cedo e sentar-nos a tempo nos nossos logares.

16. Falar quando se executa o programa. É indicio de má educação impedir que os ouros gozem do espectaculo.

17. Sahir de um theatro enquanto se representa; esperemos pelo intervallo para o fazer. As pessoas que tem este habito, e que egoisticamente incommodam os outros, offendem ao mesmo tempo os artistas e o auditorio.

18. Quando visitamos uma exposição de arte, passar por deante de outras pessoas que estão examinando qualquer das obras expostas.

19. Affectar conhecimentos artisticos ou technicos. Se realmente os possuimos, não devemos fazer delles alarde.

XVI

Das visitas


As visitas tem grande importancia na vida da sociedade. Fazem-se visitas de parabens, de agradecimento, de augúrios de pezames, de recommendação, de amizade etc. As visitas conciliam os animos, desfazem as asperezas do caracter, habituam a maneiras delicadas e a um procedimento correcto; estreitam relações de amizade, subministram conhecimentos uteis, resolvem as dificuldades nas famílias, afastam os imfortunios ou pelo menos minoram-lhes o peso. Quantas vezes uma visita reconciliou animos desde longa data separados pelo rancor. Ninguem pois deve ignorar as regras que presidem ás visitas.

1. Visitarás teus superiores e os collegas com os quaes estiveres em relação.

2. Farás visita de agradecimento a um parente, a um amigo ou bemfeitor, depois de um favor recebido.

3. Farás visita de parabens aos amigos e conhecidos, por alguma prosperidade que lhes tocou, por uma condecoração, por uma promoção etc. Nos acontecimentos tristes far-lhes-ás visitas de pezames.

4. Onde houver costume, farás visita de felicitações aos superiores, parentes e amigos, no dia do seu anniversario ou onomástico, nas festas do Natal e Anno Bom etc.

5. É um habito louvavel para os estudantes, visitar durante as ferias os seus superiores e mestres, mostrando assim o reconhecimento devido a quem tanto se interessou pelo bem delles.

6. Maior é o dever que te incumbe de visitar os amigos ou conhecidos gravemente enfermos. Estes, apenas restabelecidos, devem retribuir com as suas as primeiras visitas áquelles que se interessaram por elles.

7. Rebribuir em geral as visitas é cousa indispensavel e deve-se fazer possivelmente no prazo de oito dias. Quando, por justos motivos, te vires impedido de retribuir uma visita, procura apresentar tuas desculpas para não passares por mal educado e para não offenderes talvez a quem te visitou.

8. Desta regra se exemptam as visitas dos amigos, que, sendo ás vezes innumeras, nem sempre é preciso retribuir; egualmente os superiores não estão obrigados a isso para com os seus inferiores, mas sempre que o fizerem, darão prova de bondade e grandeze dalma.

9. O desejo immoderado de fazer e receber visitas é indicio de vaidade; por outra parte negligenciar fazer as que são impostas pelo dever ou pelo uso denota preguiça e grosseria.

10. Para as visitas deves procurar as horas mais oportunas para quem as recebe; pos isso nem muito pela manha nem muito de noite, nem durante as refeições, nem nas horas de descanço ou de funcções religiosas nos dias santos.

Informa-te dos costumes da família a quem te apresentas para não te tornares importuno.

11. Si por ventura fizeres alguma visita intespetiva, procura desculpar-te antes e depois.

12. Não entrarás na casa e tanto menos nos aposentos alheios, sem prévia licença; por isso toca delicadamente a campainha, e, na falta desta, bate de leve á porta e espera que te venham abrir ou te mandem entrar.

13. Á entrada e á sahida, deves fechar a porta, a não ser que haja alguem incunbido disso.

14. Ao entrar faze o devido cumprimento ás pessôas que se te apresentarem, de cabeça descoberta e levemente inclinado.

15. O chapéo, o guarda-sol ou bengala e o sobretudo deixam-se ordinariamente na ante-sala; quando não a houver, conservarás os mencioados objectos na mão até seres convidado a depol-os.

16. As visitas de cumprimento, de felicitações e outras semelhantes devem ser breves especialmente si quem as recebe está muito ocupado.

17. Na casa alheia não quadra bem examinar os objectos quando não forem de exposição, tanto peior tocal-os.

18. Introduzido em logar onde se estiver comendo, é grasseria passear os olhos sobre a comida ou os commensaes.

19. Durante a visita observa com escrúpulo todas as regras de civilidade expostas para a conservação e, ao despedir-te, renovas os protestos de estima e as saudações. Se te quizerem seguir, insiste para que não tenham esse incommodo; se não obstante isso, te seguirem, renova a inclinação á porta.

20. Se durante a visita perceberes que os visitados têm pressa de se desocuparem, procura despedir-te logo.

21. Quando fores tu o visitado, não faças esperar muito o visitante. Se fôr um personagem notavel, vae-lhe ao encontro na ante-sala ou na porta da rua, convida-o a depor o chapéo, o capote etc. Ao partir restitui-lhe esses objectos, acompanha-o até á porta e não te retires emquanto não se tiver afastado.

22. Quando chegar á tua casa um forasteiro, conduze-o a resfrescar-se um pouco, ajuda-o a escovar a roupa, manda-lhe dar agua e tolha para lavar as mãos etc. Se deve ficar como hospede em tua casa, designa-lhe um quarto bem arrumado, informa-o do horario, não te esquecendo de indicar-lhe os logares privados; cerca-o emfim de todo o carinho e gentileza com que tu proprio quizéras ser tratado.

23. Os meninos, ao fazerem visitas, devem ser acompanhados dos paes, ou ter ao menos sua permissão. Não te movas jamais para visitar pessôas de moralidade duvidosa; não é sufficiente não ter noticias más, e preciso tel-as bôas e de fonte certa, do contrario andarás ás cégas com manifesto perigo da tua virtude.

24. Sobre visitas observa mais as seguintes regras. Parece mal:

a) Por menos tempo que um homem tencione demorar-se numa visita, entrar na sala com o sobretudo vestido. É igualmente de mau gôsto e deselegante trazer guarda-chuva fóra do caso de necessidade; o uso é levar na mão o chapéu e a bengala.

b) Tentar apertar a mão a todas as pessôas presentes quando sejam em grande numero. Basta que o façamos ao dono e á dona da casa; um cumprimento é suficiente para os outros.

c) Estender a mão a uma senhora, sem que dela provenha a iniciativa. Em regra, nunca devemos estender a mão a pessôas de mais idade e maior categoria, caso ellas nos não anime, estendendo-a primeiro.

d) Como dona de casa, insistir com um visitante para lhe tirar das mãos o chapéu e a bengala.

e) Tirar as luvas quando fazemos uma visita de ceremónia.

f) Precipitarmo-nos para uma cadeira. É melhor esperar sempre que a dona da casa offereça para nos sentarmos, e nunca o fazermos antes disso.

g) Mostrar frieza e enfado, assim como tambem sêr efusivo e falador demais.

h) Reparar na mobília, quadros, ou noutros objectos, como se, mentalmente, estivéssemos a avaliá-los.

i) Fitar os olhos com insistencia nas pessôas presentes.

j) Não nos levantarmos todas as vezes que entra na sala uma senhora ou pessoa de respeito.

k) Reclinarmo-nos no sofá ou nas poltronas. Só no nosso quarto, bem á vontade, nos é permitida essa exagerada comodidade.

l) Cruzar as pernas quando estamos sentados. Quasi todos os homens têm êsse costume, que não é de bom gosto.

m) Apoiarmo-nos apenas nos pés traseiros das cadeiras.

n) Fazer movimentos com os pés, redemoinhos com os dedos polegares, manejos com a corrente do relógio, castão da bengala, botões, etc.

o) Falar só em assumptos que nos dizem respeito. A verdadeira educação, diz um escritor espirituoso, consiste em ouvir contar cousas, que nós sabemos perfeitamente, por pessôas que as ignoram.

p) quando nos convidam para tocar ou cantar, recusar, sem termos firme tenção de persistir na recusa. É uma intoleravel exibição de vaidade e capricho fazermos que a dona da casa teime comnosco, para, por fim, consentirmos em acceder aos seus rogos.

q) Uma dona de casa insistir com uma pessôa para cantar ou tocar, quando essa pessôa já se escusou duas vezes. A primeira escusa póde passar por acanhamento ou modestia; mas, á segunda, deve cessar a insistencia.

r) Falar em segredo deante de gente. Quando o que temos a dizer não póde ser dito em voz alta reservemos a confidencia para occasião mais opportuna.

s) Numa sala, falar com uma pessôa sobre negocios que só dizem respeito a essa pessôa e a nós proprios, ou que não pódem ser comprehendidos pelos outros.

t) Falar nas nossas doenças ou nos nossos desgostos de qualquer especie.

u) Falar de pessôas desconhecidas das que estão presentes.

v) Fazer espirito á custa dos outros, ou ridicularizar alguem.

x) Insistir em falar na belleza de pessoas que estão presentes, na riqueza das casas de outras pessôas, no brilho de diversões alheias, ou na superioridade de alguem. O louvor excessivo de pessôas ou cousas ausentes póde descontentar as pessôas presentes.

y) Depois de ouvir cantar ou tocar qualquer instrumento, referir-se elogiosamente a outras pessôas, que cantaram ou executaram o mesmo trecho.

z) Levar a conversa para o lado da religião ou da política. As discussões sobre estes assumptos são freqüentemente causa de irritação; por esse motivo vale mais evital-as.

a´) Interromper uma pessôa que está contando qualquer anecdota ou historia . É imperdoável esta falta, na sociedade.

b´) Contradizer alguem. As divergencias de opiniões offendem, mas a contradição immediata a qualquer cousa que se diz é de pessimo effeito.

c´) Questionar com as pessôas. Quando se conversa, é até interessante o vaivém continuo de replicas, mas nunca devemos cahir em discussões muito acaloradas. Quando tal succeda, os donos da casa devem intervir, e habilmente desviar a conversação para outro assumpto.

d´) Quando contamos qualquer caso, pormenorizarmos todas as minúcias e fazermos pausas a cada palavra; devemos ser claros e prontos na nossa exposição, de fórma a chegar ao fim o mais depressa possivel.

e´) Falar de um unico assumpto, ou sôbre cousas que não interessa as outras pessôas.

f´) Repetir graças já sabidas ou histórias também muito ouvidas.

h´) Repetir as conversações que ouvimos; de boca em boca as palavras perdem o sabor, e simples ditos, assim repetidos, podem causar desgosto.

i´) Contar anecdotas e referir reminiscencias sobre parentes e amigos, que não são das relações dos presentes, que estes nem sequer conhecem de ouvido, e por quem se não interessam.

j´) Mostrarmos vaidade de nossos conhecimentos, ou falarmos de nosso talento sobre qualquér matéria.

k´) Tornarmo-nos heroes das nossas próprias histórias.

l´) Se por acaso temos viajado, estar constantemente a falar dos sitios onde estivemos, ou das aventuras que nos sucederam; tambem não devemos considerar os nossos compatriotas inferiores aos estrangeiros, pela razão de serem differentes os seus costumes nacionais.

m´) Amuar porque nos imaginamos esquecidos. Pensemos, antes, em nos tornar agradáveis e acabaremos por nos divertir.

n´) Mostrar aborrecimento, mesmo com um importuno. É boa educação fazermos boa cara ás várias maçadas, inerentes á vida social.

o´) Á mesa de jogo, humedecer os dedos na bôca para passar as cartas.

p´) Mostrar mau humor quando o jogo é contra nós. Devemos pensar sempre que jogamos para nos entreter e não para mostrar a nossa pericia, e ianda menos para augmentar os nossos haveres.

q´) Deante de gente, abrir um livro e ler. Se estamos aborrecidos, é melhor irmo-nos embora; se o não estamos, devemos prestar atenção aos outros.

r´) Colocarmo-nos no sitio mais cómodo, com prejuizo das outras pessôas. Nunca nos devemos esquecer de que o egoismo é o peior de todos os defeitos.

s´) Quando um homem entra ou sai de uma casa, acompanhado de senhoras, passar adeante delas. As senhoras teem sempre a precedência.

t´) Olhar constantemente para o relogio como se estivessemos impacientes de ver passar o tempo.

u´) Demorarmo-nos tempo demais numa visita, ou sairmos precipitadamente, fazendo que as outras pessôas tambem sáiam. Basta um bocadinho de observação e bom senso, para calcularmos a occasião própria para nos despedirmos.


XVII

Das reuniões, theatros, academias etc.


D. Bosco, o grande apostolo da juventude, dizia que o theatro deve ser destinado a cultivar o coração e que portanto jamais poderá ser causa da minima offensa de Deus. Foge pois d´aquelles espetaculos publicos onde como quer que seja se acha em risco a tua virtude, e procura tirar vantagem das diversões innocentes, que se costumam dar nos institutos de educação catholica. Para taes diversões observa as seguintes regras:

1. Quando se te conceder tomar parte num espectaculo, academia etc., sê grato para com os superiores, que com sacrificio a promovem, não dando signaes de inquietação, quando tiveres que esperar ou se representassem cousas que não fossem do teu agrado.

2. Não te precipites, não passes na frente dos outros, não tomes o melhor logar; conserva-te de cabeça descoberta, no teu logar marcado e não de pé, para que os outros possam ver livremente.

3. Não grites, não assobies, não faças signaes immoderados de alegria, e evita tudo quanto deve evitar um menino bem educado.

4. Apenas começado o entretimento ou levantado o panno, se for theatro, déves logo ficar em silencio. Si houver na tua frente alguem que te tire a vista, avisa-o com bons modos e não com maneiras bruscas.

5. Nunca desprezes e ridicularises o companheiro ou os companheiros que não representam bem, nem sequer dês signal de desaprovação. Ao cahir o panno, ou ao terminar o canto ou declamação, applaudirás sempre, embora não tivesse sahido a teu gosto.

6. Deves a todo custo evitar o mau costume de tossir e assoar-te a cada instante, ou perturbar como quer que seja a declamação, e, peior ainda, imitar os gestos ou a vóz do personagem. Não é sem duvida este o modo de recompensar a quem faz todo o possivel para te recrear, á custa talvez de grande sacrificio.

7. Os que se deverem apresentar em publico, estejam bem preparados, para não fazerem figura ridicula e aborrecerem aos presentes que, si têm deveres, têm outrosim direitos. Quizera que me entendessem bem aquelles que, ou por deficiencia de preparação, ou por fraqueza de vóz ou por mesquinhez de materia, ou por falta de habilidade ou por qualquer outro motivo, tornam-se importunos, ou antes, insupportaveis ao auditorio. Optima e sapientissima cousa seria que esses oradores, apenas percebem o descontentamento geral, (e não é difficil perceber o sussuro e o bulicio dos ouvintes, os seus freqüentes e prolongados applausos, na realidade pouco merecidos), pruzessem termo aos seus arrazoados. Isto não seria culpavel mas cousa muito louvavel, ao passo que a obstinação seria fructo de orguho e má educação.

8. Sahindo do theatro guarda a devida ordem e não te abalroes na porta. Como em geral a temperatura de fora é mais fria, procura agasalhar-te bem ao sahir, para não apanhares resfriados.

XVIII

Do asseio


1. O asseio do corpo é dever principalissimo d´uma pessôa bem educada. Deves tomal-o muito a peito, porque a limpeza exterior revela, geralmente, a ordem e a pureza da alma, capta a sympathia e contribue para a saude do corpo.

2. Não te esqueças de tomar banho todas as semanas ou mais amiúde. Ao despertares pela manhã lava o rosto, as mãos e o pescoço e as orelhas fazendo uso de sabonete. Ficou celebre este dito dum historiador: “Eu meço a civilidade de um paiz, pelos kilogramas de sabão que consome.”

3. Vê que as tuas unhas nunca estejam crescidas ou orladas de preto. Apára-as ao menos semanalmente com a tesoura, não com os dentes e nunca em presença de outrem; não as cortes demais que seria prejudicial.

4. Os dentes devem-se lavar e escovar todos os dias. O asseio mantem-n´os, preserva-os da carie, e impede o mau halito.

5. Todas as manhãs deves pentear o cabello, o qual, para poder conservar-se asseiado e arranjado, não deve ser demasiado longo; uma cabelleira desgrenhada e empoeirada dá á pessôa um aspecto selvagem. Guarda-te porém de toda a efeminação e vaidade para fazeres bonita figura; não uses ungüentos e essencias perfumadas que amesquinham o caracter. Até os pagãos censuravam o cuidado exagerado do cabello.

6. Os pés devem ser lavados com frequencia, para não causarem damno á saúde e incommodo aos visinhos. Inqualificavel grosseria é a d´aquelles que tiram as botinas em presença de outrem.

7. Não imites os que coçam a cabeça, enxugam o suor com a manga do paletot ou com a mão, levam as mãos á bocca, aos olhos, ao nariz, e ás orelhas. Para taes necessidades é que temos lenço.

8. Não deves tossir ou espirrar com força ou proximo ás pessôas ou alimentos, flores etc. Procura pois voltar-te um pouco e levar o lenço á boca.

9. Grosseria crassa é a de escarrar e cuspinhar a cada momento, mais por habito do que por necessiade; cumulo de incivilidade seria cuspir por alto e com estrépito. Quando verdadeira necessidade o exigir, procura a escarradeira de modo que ninguem o perceba. Estando dentro de casa, jamais cuspas no chão.

10. Assoando-te, não deves fazer rumor como som de trombeta, nem usar ambas as mãos. A acção deve ser feita com a máxima desenvoltura, sem olhar depois para o lenço, nem metter os dedos nas narinas, como para completar a limpeza. O lenço depois de uzado não deve ser dobrado mas guardado de qualquer modo e com a maxima presteza.

11. Troca freqüentemente de lenço; não o ponhas sobre a meza. Si alguem deixar cahir ou esquecer o lenço em tua presença, advertil-o-as educadamente, mas nunca o apanharás tu mesmo.

12. Uzem grande attenção e empenho, neste particular, todos os que fazem uso de rapé. Estejam sempre premunidos de lenços e empreguem-n´os freqüentemente, procurando previnir a necessidade.

13. Quanto ao escarrar, venço a grande repugnancia que sinto e digo que não ha no vocabulario adjectivo para estigmatizar a incivilidade d´aquelles que arrancam dos pulmões os escarros, para cuspil-os ou engulil-os, produzindo um rumor desagradável, e grande nausea aos presentes.

14. É igualmente contrario ao asseio dizer ou fazer qualquer cousa inconveniente por si mesma ou que traga á memoria cousas nojentas e nauseantes.

15. Não offereças a outrem para cheirar, cousas que cheiram mal, como tambem jamais dês para provar cousas de mau sabor ou chames a attenção para o que é nojento.

16. Acontecendo alguma cousa de que resultasse para alguem confusão e vergonha, não faças caso e procura distrahir a atenção dos mais; si esse alguem fores tu e perceberes que os outros te observam pede-lhes desculpa em poucas palavras.

17. Á limpeza da pessoa é inherente o asseio da roupa, dos objectos do proprio uso, dos quartos que se habitam etc.

18. Para o asseio e conservação da roupa procurem os meninos não se sentar no chão, não se encostar ás paredes, não freqüentar brinquedos ou companheiros que os façam enxovalhar ou rasgar a roupa.

19. Escova tua roupa diariamente, de modo particular pelas costas para tirar a caspa, indicio de negligencia. Tem cuidado de não te sujares de sopa, café, vinho ou molho, de não te sentares em logares molhados e de não enxugares as mezas ou bancos com as mangas do teu casaco.

20. A roupa não deve servir de toalha nem de lenço. Ha muitos, especialmente entre os meninos, que para enxugar o rosto do suór e limpar os labios, empregam uma banda do paletot ou uma das mangas; outros há que enxugam as mãos nas calças; outros emfim, ao terminarem de escrever, passa a penna na camisa, no casaco, cabello etc. Todos esses mostram grande atrazo nas regras de civilidade.

21. Grande desleixo e desasseio mostram tambem os que trazem desamarrados os sapatos, ou o casaco; as calças abotoadas só pela metade, os bolsos cheios, o pescoço a apparecer, a gravata sôlta, os punhos da camisa cahidos etc.

22. As ceroulas não devem apparecer nem acima da cintura nem por baixo, junto das botinas, e sobretudo devem-se conservar sempre atacadas de modo que não lhes appareçam os cadarços.

23. Quem usa cinta não a conserve muito abaixo da cintura. É incivil tirar a cinta na presença de outrem, para arranjar as calças, ou usar d´ella como d´um brinquedo, girando-a, ou batendo nos outros.

24. Quando por ventura se descóse ou se rasga a roupa, é preciso mudal-a; o mesmo se observe quando estivér demasiado apertada.

25. Dormir com a roupa com que se passou o dia é proprio do preguiçoso, isto estraga a roupa, prejudica a saúde, impedindo a livre circulação do sangue e a transpiração. Deve-se usar camisa de dormir.

26. Vestindo-se e despindo-se é preciso ter cuidado com a roupa. Não imites pois aquelles meninos mal acostumados, que desabotoam d´um só golpe toda a roupa, arrebentam os cordões, rasgam e atiram as peças em desordem, vestem a roupa ás avéssas, calçam trochadas as botinas etc.

27. Vestir-se e despir-se são actos que se devem fazer sem auxilio de ninguem e com toda a decencia, não deixando descoberta, tanto quanto for possível, nenhuma parte do corpo.

28. Usa muita limpeza no leito, arruma-o com cuidado todas as manhãs, estende bem os lençóes de modo que não pendam mais dum lado que do outro. Deitar-se na cama fóra de horas de descanço é preguiça e molleza.

29. Ama e conserva a limpeza em tudo; nas salas, nos armarios nos bahús, na roupa, nos livros e cadernos etc. A ordem e a limpeza facilitam o trabalho, poupam dinheiro e agradam a todos.

30. Não atires por terra restos de fructas, pedaços de papel, farrapos, phosphoros usados etc., mas põe-n´os em logar apropriado.

31. Não sujes nem risques os bancos, as portas, as janellas, as paredes etc.: isto indica falta de educação e causa ás vezes damnos consideráveis.

32. A todos cabe o dever de zelar pela limpeza das privadas, porque d´outro modo tornam-se fóco de doenças. Não se escrevam sentenças, nem se façam garatujas de nenhuma especie. Do estado desse logares se pode argumentar a educação dos que os usam.

33. Permitta-se-me aqui reprovar o prodecer d´aquelles que ao sahirem de taes logares continuam a vestir-se e abotoar-se fóra, dando prova patente da sua má educação.

34. Emfim procura não levar para casa a lama dos caminhos; antes de entrar limpa as botinas no ferro, malha ou capacho que em geral se acha á porta ou na calçada.

 

XIX

Do vestuario, porte e habitos pessoaes


No vestir, mais do que em outras cousas, deve-se guardar um razoavel meio termo entre os excessos, os quaes denotam vaidade ou negligencia.

1. A negligencia no vestir revela falta de attenção e respeito devidos ás pessôas com que se convive e ás vezes denota consciencia perturbada.

2. Deves, porém, evitar o luxo e a vaidade que consiste em ir atrás de todas as modas; ornar-se e adornar-se para attrahir os olhares, e vestir-se como um manequim. Estes modos effeminados dão provas de insensatez, de mesquinhez de caracter e de affectos, de instrucção superficial, e quiçá de desejos desordenados. Neste assumpto, como em tudo mais, deve predominar a simplicidade. Não deixes que teu corpo domine e escravize o teu espirito, o que seria a maior das degradações.

3. Teu vestuario seja commodo, decente e conforme á tua edade, á tua condicção, aos logares, tempo e costumes. O sentimento christão exige que tambem por meio do vestuario se distingam os dias sanctificados dos dias de trabalho.

4. O desalinho e descuido no vestir repellem a sympathia, pela característica de desordem que dão á pessoa. Não tolleres rasgões nas roupas e no calçado; nunca te falte um botão.

5. A correção e asseio exteriores reflectem de algum modo a honestidade interior. Na roupa, quanto fôr possivel, não deves deixar manchas ou nodoas de oleo, de tinta etc. A roupa de sahida seja escovada com freqüência.

6. O chapéo deve ser bem collocado na cabeça; desabal-o para a frente ou pendel-o sobre as orelhas são modos de garotos da rua; enterrado na cabeça indica rusticidade e cahido sobre a nuca revela leviandade.

7. As botinas devem ser commodas e bem limpas. Os chinellos ou sandalias só se usam á noite; não é permittido descer ao refeitorio, á egreja e muito menos sahir á rua, de chinellos.

8. Nas occasiões de funeraes e tambem nas procissões, baptizados etc. usa-se roupa preta. Assim tambem deve-se trajar de preto, ou ao menos pôr um fumo no braço esquerdo, em signal de lucto, após a morte de algum parente.

9. O porte da pessoa indica em geral a educação que ella recebe, a sociedade que freqüenta, a estima em que é tida, o dominio que exerce sobre si mesma e a consideração que usa para com as pessôas que a cercam. É cousa importantissima habituar-se a um porte nobre; para o conseguir devem os jovens empregar as suas energias ainda robustas: enthusiasmo do espirito e docilidade do corpo.

10. Seja teu porte natural, erecto, franco e desenvôlto. Não assenta num jovem andar curvo ou penso d´um lado como si lhe faltassem ossos. Abandonar o corpo a qualquer posição é indicio de preguiça, de fraqueza de vonttade ou de indifferença e desprezo para com os presentes, quando não denota indolencia e ignorância. Tampouco deves andar teso e de peito estufado, ou ter um porte militar.

11. A cabeça deve estar sempre erguida, não atirada com indolencia para traz ou para os lados. Não a gires a cada passo como uma ventoinha nem a conserves tesa como uma coluna. Da posição habitual da cabeça alguns argumentam o caracter duma pessôa.

12. A expressão do rosto deve ser amavel e digna; um rosto carregado e nublado, refletindo um enfado habitual, só grangeia antipathia e desconfiança.

13. Teu olhar seja sereno e franco, tua fronte sem rugas, teus labios não se crispem bruscamente, mas conservem um leve sorriso. Não deixes que teu olhar vagueie cá e acolá, signal de leviandade e immortificação; não gires os olhos nas orbitas, o que dá ao aspecto um quê de austéro e selvagem; não fixes demais o olhar em pessôa ou cousa alguma para não passares por incivil.

14. É mais hygienico respirar pelo nariz que pela bocca; deve-se por isso conservar a bocca sempre fechada. Os tregeitos dos labios durante a conversação indicam trivialidade.

15. Tambem pertence á nobreza do porte, não resmungar, não fungar, não contarolar, não rir desordenadamente. O estulto, diz a Escriptura, levanta a voz quando ri, mas o sabio apenas sorri. Assobiar, mesmo estando sósinho, revela educação vulgar.

16. As mãos exercem papel importante no porte duma pessôa; não se devem metter nos bolsos, cruzar sobre a cabeça, pôr nos quadris, esfregar a cada momento etc. Tambem é reprovavel, como se disse atraz, estalar os dedos, espreguiçar-se, passar a mão continuamente pelo rosto, metter os dedos na bocca, no nariz, etc. bem como tocar tambor sobre as mesas ou nas vidraças.

17. Conserva as mãos no seu logar, isto é, não toque nas pessôas com quem falas, não as tomes pela mão ou pelo braço, não batas nas costas dos outros, não lhes faças cócegas. – Evita estes e outros actos descorttezes e não permittas que se usem para contigo.

18. É licito gesticular com as mãos enquanto se fala, par dar mais efficacia e energia ao discurso; porém, sejam esses gestos moderados.

19. Estando de pé, conserva o corpo aprumado; não lhe abandones o peso sobre uma perna, dobrando a outra, não te encostes, quanto for possivel, ás paredes, ás arvores etc.

20. Sentado, apóia as mãos sobre os joelhos ou sobre a mesa, quando houver; não cruzes as pernas, não te sentes dando a frente ou um dos lados para o espaldar da cadeira, nem neste estejas a balouçar-te. Em companhia não te sentarás, se os demais estiverem de pé ou vice-versa. Procura emfim não te sentares mais do que o necessario, para não envelheceres precocemente.

21. O andar adápta-se á edade e ao estado de cada um. O andar desanimado lento é signal de fraquesa e indolencia; o andar precipitado indica estouvamento e leviandade e expõe a não poucos perigos. A préssa no andar póde, porém, ser justificada, como por exemplo, por um negocio urgente, por uma desgraça, por motivo de chuva etc.

22. Quando andas deves olhar para o chão, para veres os obstaculos que tens á frente e não dares encontrões nos transeuntes ou nas arvores; os braços não se devem agitar demasiado como badalos de sino, nem se devem bater os pés como para enterrar as pedras.

23. Emfim empenhem-se todos por adquirir um porte nobre e conserval-o hatibualmente, tanto sós como em companhia, certos de que não captivarão jamais a benevolencia e sympathia, usando maneiras bruscas e indolentes.

Ainda a respeito de vestuario e habitos pessoaes guarda-te de:

a) Usar roupa branca enxovalhada. Devemos ser especialmente escrupulosos neste ponto.

b) Não ligar importancia a certos promenores de toilette. Muitas pessoas , asseadas noutras particularidaes, descuidam, por exemplo, o arranjo das unhas, trazendo-as pouco cuidadas.

c) Deixar crescer pelos dentro das ventas, ou das orelhas, minúcias de toilette, das quaes muitas vezes não fazemos caso.

d) Limpar os ouvidos, o nariz, polir ou limpar as unhas deante de gente. O asseio e a elegancia em todas as cousas que dizem respeito á toilette são indispensaveis, mas todos esses arranjos se devem fazer longe das vistas dos outros.

e) Usar nos fatos côres berrantes.

f) Usar qualquer cousa no vestuario, que seja amaneirada. É preferivel escolher côres comedidas, e não adoptar qualquer feitio que torne a figura caricata.

g) Usar alfinetes, anéis ou qualquer jóia, que dê muito na vista. Botões de camisa, alfinetes de gravata, corrente de relógio, etc. são artigos necessários; estes mesmos objectos, quanto mais simples, mais apropriados são á toilette masculina.

h) Assobiar na rua, nos carros, em reuniões públicas, emfim em todos os sítios onde isso possa incommodar. É mesmo mais delicado nunca assobiar.

i) Rir com estrondo. Faz gôsto ouvir rir naturalmente, mas não ouvir gargalhadas estridentes que irritam os nervos e são impróprias de pessôas educadas.

j) Sorrir ou fazer trejeitos a propósito de qualquér cousa. O sorriso ou o riso devem vir em ocasião apropriada, pois rir constantemente e sem motivo é signal de pouco siso.

k) Bocejar, soluçar ou espirrar deante de gente. Quando receamos que isso succeda, devemos deixar de respirar um instante, e os soluços ou espirros desapparecerão.

l) Assoar-te ruidosamente. Quanto menos barulho fizermos, melhór.

m) Têr o hábito de deixar descaír o labio inferior, e conservar a bôca aberta; mesmo quando dormimos, a bôca deve conservar-se sempre fechada. É indício de fraqueza de carácter, e até nocivo para os dentes e para o estado geral, o mau hábito da bôca aberta.

n) Levar constantemente as mãos á cara, com o pretexto de torcer os bigodes, arranjar o cabêlo, etc.

o) Irromper pelo quarto de outra pessôa sem pedir licença. É sempre costume bater á porta e esperar que respondam, antes de se entrar. Por maior que seja a nossa intimidade, nunca devemos esquecer este pormenór.

p) Não tirar o chapéu (evidentemente referimo-nos ao sexo masculino) em qualquer aposento particular.

q) Entrar em casa alheia a fumar.

r) Mexer em cartas, contas, ou cousas de carácter particular, que se encontrem em cima da secretária de outra pessôa.

s) Olhar por cima do hombro de alguém que está lendo ou escrevendo. Devemo-nos conservar um tanto apartados.

t) Têr as pernas em tremor nervoso, oscilar ou bates com os pés, abanar com o corpo.

u) Ao fechar as portas, bater com elas, e esquecermo-nos de as fechar, quando entramos ou saímos de qualquer aposento.

v) Beber vinho ou qualquer bebida alcoólica em jejum. O melhor é não beber vinho, senão às refeições. Não haja vergonha em recusar qualquer bebida que nos ofereçam. Quem se escandalizar coma recusa, mostra que não é nosso amigo, nem digno da nossa amizade.

XX


Da Saudação

1. Desde jovem, habitua-te a saudar devidamente as pessôas com quem te encontrares. A saudação é um reflexo do amor do proximo; ella inflúe no animo de quem a recebe de tal modo que faz logo conceder juízo favoravel da pessôa que a faz.

2. A saudação num encontro faz-se com um aperto de mãos entre amigos, tirando levemente o chapéo e fazendo ao mesmo tempo uma inclinação com os superiores. Nunca extendas a mão por primeiro a um superior; se este a offerecer, tocal-a-ás levemente.

3. O chapéo tira-se por completo. É ridiculo erguer-lhe simplesmente a aba ou tiral-o e conserval-o suspenso sobre a cabeça. A saudação militar é reservada exclusivamente aos militares.

4. A falta de desenvoltura e a indecisão no saudar indica que o individuo ainda não tem o habito de cortezia.

5. Quando se avistam de longe amigos ou superiores, tem-se obrigação de saudal-os o melhor possivel , isto é, tirando o chapéo, e inclinando-se amavelmente.

6. Quem tiver na bocca um cigarro, deverá tiral-o com a esquerda e descobrir-se com a direita.

7. Se o personagem que se encontra é notavel, como um bispo, um ministro etc. é necessario deter-se um pouco em attitude de respeitosa reverencia e ficar descoberto até que elle se afaste. A expressão do rosto deve ter diversos tons, conforme o estado e condição de quem saúda; grave a respeitosa para com os superiores, cordial e alegre com os eguaes, amavel e benigna pra com os inferiores.

8. Pelo caminho saudarás: a) as pessôas que te saudarem, - b) as pessôas que saudarem quem te acompanha ou sejam por elle saudadas, - c) os superiores, mestres, patrões, bemfeitores, conhecidos e amigos, - d) todos os personagens disctintos civis e ecclesiasticos, embora desconhecidos. O soldado tem o dever de cumprimentar os seus officiaes, quer os conheça quer não; ora, os sacerdotes são os officiaes da milicia catholica.

9. Passando por diante de uma egreja ou capella onde se conserve o Santissimo, deves saudar a Jesus Christo, descobrindo a cabeça. O mesmo farás ante as imagens e os altares.

10. Encontrando uma procissão ou um funeral tirarás egualmente o chapéo, e te conservarás em posição respeitosa até que o prestito tenha passado. Se encontráres o Santissimo quer em procissão, quer como viatico, ajoelhar-te-ás com ambos os joelhos até que se tenha afastado.

11. Desviar o olhar de uma pessôa conhecida é mais do que grosseria: é vileza; não saudar as pessôas com quem se teve alguma desavença, denota sentimento antichristão; não saudar uma pessôa porque é de condição huminde é orgulho manifesto.

12. O aperto de mãos é signal de amizade e intimidade. Quem dá a mão deve fazel-o com garbo, apresentando toda a mão, não um ou dois dedos só; o outro deve apertal-a delicadamente sem a sacudir.

13. Os abraços são permittidos entre amigos, depois de uma ausencia ou quando se separam por algum tempo; abraçar-se, porém, em plena rua não seria muito conveniente, sem um motivo razoavel, por attrahir demasiado os olhares. Os superiores usam ás vezes este signal de benevolencia para com os inferiores, mas estes nunca devem ser os primeiros, exceptuados raríssimos casos.

14. Os beijos só são permitidos entre parentes intimos, como : pae, mãe, irmãos – Dão-se por occasião de separação ou de volta, após longa ausencia, e só pertencem á intimidade domestica.

15. Os filhos, á primeira vez que vêm seus paes, pela manhã, e á noite, antes de se deitarem, devem tomar-lhes a bençam.

16. Entre amigos e conhecidos costuma-se acompanhar a saudação com alguma phrase, como : Bom dia, bôa tarde, bôa noite! ou como vae?, como tem passado? etc. a que se responde,vou bem, obrigado, e o senhor? Quando se continúa a conversar e se está na presença de algum superior, conserva-se a cabeça descoberta até se receber convite para pôr o chapéo.

XXI

Do proceder nas viagens

Todos sentem prazer ao verem-se nas viagens, rodeados de companheiros cortezes e civis. É portanto de summa utilidade saber como se deve viajar.

1. Nas viagens dever trajar, se não como nos dias de festa, ao menos com decencia e asseio; é este um dever não só para com as pessôas com quem viajas ou com quem te podes encontrar, como é tambem um dever para contigo mesmo, porque nas viagens estás exposto a mil olhares e a mil juizos.

2. Para as viagens de trem dão-se as seguintes normas:

a) Cada um é livre de procurar a propria commodidade, sem todavia lesar a caridade e a cortezia. É conforme a civilidade deixar, ou antes offerecer os logares mais commodos ás pessôas respeitaveis e idosas e aos superiores. Taes attenções são uma recommendação da nossa pessôa aos companheiros de viagem.

b) A pessôa educada não se atropela nos vagões, não empurra os ouros para tomar os logares melhores, não occupa mais logar do que o necessario, não estira as pernas sobre os assentos, etc.

c) Nas viagens, deve-se antes de tudo apprender a calar. Assim como não se deve falar muito, tambem não se deve falar alto de maneira a perturbar a conversa ou a leitura dos outros. Nunca é demasiada a reserva, sobretudo com extranhos; portanto não fales das tuas cousas intimas e familiares ou de cousas de cuja revelação te possas arrepender. Quantas vezes a loquacidade por demais ingenua nas viagens foi causa de grandes males e lutas sangrentas!

d) Evite-se tudo quando póde produzir nojo ou incommodo nos outros, como fumar próximo de outros viajantes, fazer rumor ou cantar, etc. Si se perceber que uma janella aberta incommoda alguem, deve-se fechar immediatamente por mais agradavel que nos seja o ar.

e) Procure-se, quanto possível, não comer no trem, si todavia não se puder fazer diversamente, uzem-se alimentos asseiados e não muito cheios de molho. É permittido offerecer aos companheiros de viagem mais proximos, fructas e doces; outros alimentos só a pessôas intimas se podem offerecer.

f) Descendo de trem usa os devidos reparos, afim de não incommodares aos outros. Portanto, não te precipites para seres o primeiro, não dês encontrões nas pessôas, procura não esquecer nada etc. Saúda cortezmente os companheiros de viagem com expressões delicadas.

g) Os avisos da companhia ferroviaria devem-se observar á risca para evitar abusos, estragos e desastres.

3. O mesmo que se disse para os trens, diga-se para os bondes, observando que nos bondes não se póde comer e só se pode fumar nos bancos em que isso é permitido.

4. No hotel o viajante tem uma relativa liberdade, a qual, porém, não o dispensa das regras de conveniencia.

a) Conserva um aspecto modesto e cortez; não faças actos triviaes, não sejas austero, exigente, imperioso para com os criados. Occorrendo queixar-te, faça-se isso com as devidas considerações.

b) Ás refeições recorda as regras já expostas para tal fim. Não dês motivos a juizos desfavoraveis sobre a tua probidade.

c) Ao despedir-te paga a conta sem longo questionar e dá de bom grado um gorgêta aos criados.

5. Se visitares uma egreja, um instituto, um museu etc. poderás ver tudo, mas em nada deverás tocar sem permissão. Os antigos diziam que os nomes dos estultos são escriptos em toda a parte, por isso guarda-te de escreveres o teu nome em qualquer dos logares a que fizeres visita.

XXII


Do proceder como hospede

A hospitalidade muito contribue para estreitar e solidificar a amizade. Convem pois apontar aqui alguns deveres tanto de quem offerece hospitalidade como de quem a recebe.

1. Quem convida alguem á sua casa deve:

a) Subministrar ao hospede quando fôr necessario para a sua permanencia.

b) Ir esperal-o á estação se puder, ou mandar alguem da familia e, só em ultimo caso, o criado.

c) Depois dos primeiros cumprimentos, acompanhal-o ao aposento que lhe foi destinado, dizendo-lhe que póde fazer de conta que está em sua casa, que não faça cerimonias etc. etc.

d) Acompanhando-o deve revistar o quarto para ver que nada falte.

e) Tratal-o com toda a amabilidade, leval-o a algum passeio para ver as maravilhas da cidade ou do logar etc.

f) Não lhe dar suspeitas de que por sua causa algum membro da familia teve que se incommodar, dormir fóra, ou que a sua presença trouxe desarranjo ao andamento da casa etc.

2. Pode-se acceitar hospitalidade:

a) Quando se conhecer que a offerta é feita de coração e não, como ás vezes succede por pura formalidade.

b) Quando quem a offerecer tiver o direito de o fazer. Cabe aos paes convidar aos amigos e companheiros de seus filhos. Quem fosse a uma casa sem ter sido convidado se exporia a uma repulsa ou a uma má recepção.

c) Quando quem convida tem meios para a manutenção do hospede. Se percebermos que a nossa visita traz incommodos ou que a nossa presença causa certo enfado a alguem, melhor e mais prudente será não acceitarmos.

3. Sem algum motivo não convem ir visitar senão parentes muito chegados ou amigos intimos. Chegando d´uma viagem, melhor é que se vá a um hotel. Mas se um amigo ou conhecido convida instante e sinceramente, recusa-se no principio cortezmente, mas depois pode-se acceitar.

4. O hospede tem deveres para com a familia que o recebe:

a) Mostre-se satisfeito e alegre do tratamento, não censure a habitação, a comida, a criadagem etc., ao contrário, use todos os signaes de approvação e reconhecimento.

b) Evite tudo quanto possa ser molesto. Não se intrometta em tudo, não reviste todos os logares da casa, não mostre muita curiosidade de saber dos interesses da familia etc.

c) Não esqueça que é geralmente bem recebido aquelle hospede que permanece pouco tempo; portanto despeça-se logo que puder, para não se tornar enfadonho.

d) Seja generoso e ao partir dê alguma gorgeta aos criados pelos seviços recebidos.

e) Tenha em vista a grande obrigação do segredo sobre os negocios da familia. Quem convive por muito tempo com uma familia , chega a ter noticias sobre os haveres, interesses, liames e mil outros particulares que não devem de modo algum ser divulgados.

Preceitos geraes

Guarda-te de:

1. Pedir livros emprestados e não os devolver promptamente. Tambem os não devemos estragar, dobrar as lombadas ou as páginas, nem escrever nas margens ou enchel-as de nódoas. Todo o cuidado é pouco com objectos emprestados.

2. Tocar, em excesso, violino, piano, ou qualquer instrumento músical. Os vizinhos têm nervos, e não os devemos maçar constantemente. Se pudéssemos conseguir tocar somente um instrumento depois de o conhecermos perfeitamente, seria um ideal, principalmente para os que nos ouvem.

3. Ser egoista.

4. Não ser pontual.

5. Irritar-te, se as cousas não te correm bem.

6. Estar carrancudo e silencioso.

7. Ser rabujento; não existe paz numa casa, onde haja uma pessoa com esse deploravel defeito.

8. Incomodar de algum modo os teus vizinhos.

9. Se praticares alguma boa acção, falares nella depois.

10. Servir-te com frequencia das tuas relações, para lhes pedires favores.

11. Lêr cartas que não te são dirigidas, sem permissão do destinatario, por mais familiar que te seja o nome que as subscreve.

12. Dar promptamente conselhos sobre o viver domestico ou economico de qualquer pessoa.

13. Suppor que qualquer excentricidade, como usar o cabelo comprido de mais (referimo-nos ao sexo masculino), trazer as unhas muito crescidas ou o fato com um córte especial, etc., são signaes de genio artistico ou poético.

Na casa alheia

Guarda-te de:

1. Quando fores ao campo visitar alguem, demorares-te, se não tiveres grande intimidade com as pessoas que te convidam e ellas não insistem para o fazeres.

2. Tomares demasiado á letra o convite dos donos da casa “ para estares tanto á vontade em casa delles como na tua propria.”

3. Quando estiveres hospedado em qualquer casa, deixar de seguir os costumes dessa casa, como levantares-te ou deitares-te tarde ou cedo de mais, fumar nos quartos, lêr na cama, etc.

4. Esqueceres-te de vir previnido com papel de cartas, sellos, navalhas de barba, escovas de dentes etc. Nunca devemos pedir emprestados estes objectos.

5. Quando estiveres hospedado em casa de algum amigo, visitar uma pessoa, com quem o dono a casa tem relações cortadas, embora essa pessôa seja muito da tua intimidade.

Para as crianças

Muitas das instruções, que damos neste livro, são tão aplicáveis ás crianças como ás pessôas crescidas; no entanto algumas há especialmente dedicadas á infância. Neste capitulo repetimos, contudo, alguns dos preceitos que temos dado nos precedentes, afim de bem se fixarem nos espiritos infantis.


Para os rapazes

Guardem-se de:

1. Diminuir a polidez e a consideração que a todos se deve, com a idéia falsa de pareceres affectado ou effeminado. Os rapazes querem-se vigorosos e varonis, o que não quér dizer que não possam juntar a essas qualidades uma excelente educação social. Convém que os usos um pouco livres de certos esportes não prejudiquem as boas maneiras, essenciaes na sociedade; estas devem cultivar-se com afinco, de modo que á força de hábito se tornem uma segunda natureza.

2. Esquecerem-se de dar os bons dias todas as manhãs á familia, e, ao deitar, as boas-noites. Quando um rapaz entra na aula, deve tambem cumprimentar logo o professor, assim como quando sai.

3. Quando se encontram na rua senhoras conhecidas, não lhes tirar o chapéu: o mesmo se deve sempre fazer aos homens mais idosos.

4. Não se levantarem, quando entra alguma visita.

5. Entrar precipitadamente mum quarto, sejam quaes forem as circunstancias, sem pedir licença, e quando entrarem, não cumprimentar delicadamente todas as pessoas presentes. Quando se apresentarem não devem tocar na mão de pessôa alguma, sem que ella o faça primeiro.

6. Interromper qualquer pessoa quando fala. Não é mesmo de bôa educação os rapazes meterem-se na conversação das pessoas adultas.

7. Assobiar deante de pessoas de respeito, tamborilar numa cadeira ou na parede, bater com os pés no chão, finalmente fazer qualquér barulho desnecessario e incomodo, deante de gente.

8. Gritarem quando falam, dentro ou fóra de casa.

9. Esquecer todas as instruções que no primeiro capitulo deste livro se referem á maneira de estar á mesa.

10. Sentarem-se antes das outras pessoas.

11. Tamborilar na mesa ou fazer barulho durante as refeições.

12. Brincar com o talhér ou com qualquer objecto.

13. Debruçarem-se sobre a mesa ou pôr sobre ella os cotovelos; podemos apenas apoiar as mãos ou os pulsos.

14. Gorgolejar quando se come a sopa.

15. Estender a cabeça por cima do prato, como se nunca tivessem visto a iguaria servida, ou tivessem mêdo de que alguém a roubasse.

16. Afastar muito os cotovelos do corpo.

17. Comer com a faca. Só se levam á bocca a colhér ou o garfo.

18. Engulir grandes bocados.

19. Fazer ruído com a bocca, quando comem ou bebem.

20. Sêr menos respeitosos com o professor ou pouco applicados ao estudo.

21. Maçar os condiscipulos com partidas.

22. Apoquentar os irmãos ou os companheiros de brinquedo. Não ha nada mais aborrecido do que uma criança rabugenta.

23. Esquecerem-se das attenções que deve ás pessoas mais velhas. São ellas, a um tempo, prova de delicadeza de sentimentos e de maneiras.

24. Praticar actos, que depois os possam envergonhar.

25. Deixar de dizer a verdade em todas as circunstancias. Sejamos sempre francos, cordeaes e honestos.

26. Trazes as mãos ou as unhas sujas, e descuidar a limpeza dos dentes, ouvidos, etc. Os rapazes bem arranjados e asseados, tornam-se simpáticos a toda a gente.

Para as meninas

Quasi tudo o que já dissemos acerca dos rapazes deve ser igualmente applicado ás meninas.

Guardem-se as meninas de:

1. Tratar sem consideração as pessoas que nos são inferiores. É desagradavel ouvir uma menina ralhar com os criados, ou dar quaesquer ordens de uma maneira autoritaria. O bom tratamento para com os inferiores é indicio de polidez e tambem de uma alma bem formada.

2. Não cumprimentar amavelmente todas as pessoas da familia, pela manhã.

3. Amuar, quando os nossos irmãos as metem em ridiculo. Da parte dos manos, não é isso bom costume; no entanto, quando tal succede, nada há como levar o caso de brincadeira e não lhe ligar importancia alguma.

4. Ser egoistas. Para sermos verdadeiramente bem educadas, devemos sempre pensar nas conveniências do outros, antes de pensar nas nossas.

5. Occupar o melhor logar em qualquer sitio onde haja pessoas adultas.

6. Tagarelar com as companheiras, quando as pessoas adultas estão conversando.

7. Dizer segredos diante de gente, e continuar a lêr quando alguem entra na sala onde estamos.

8. Ser desmazeladas.

9. Sentarem-se com as pernas cruzadas.

10. Roer as unhas, brincar com os caixos ou madeixas, apontar com o dedo, remexer-se na cadeira.

11. Meter na bocca lapis, canetas, borrachas e outros objectos semelhantes. É um habito que se contrai facilmente, mas que se perde com um pouco de boa vontade.

12. Comer guloseimas em excesso.

13. Quando estiverem na Egreja, olharem á roda, ou pasmarem para quem entra.

14. Não chegar a horas a qualquer reunião, que as tenha marcadas. Não ha nada mais incomodo e menos polido do que a falta de pontualidade.

15. Esquecerem-se de agradecer, quando alguem presta qualquer serviço ou faz algum favor.

16. Apontar para as pessoas que vemos na rua, e deixar de corresponder ás que nos cumprimentam.

17. Falar em tom de voz muito alto ou estridente.

18. Ser afectadas na maneira de falar. Devemos sêr simples e naturaes.

19. Ter modos petulantes.

20. Dizer cousas desagradaveis ás companheiras de brinquedo, e mostrar inveja de vestidos ou chapéos usados por outras meninas. É impossível termos tudo quanto desejamos, e é doidice ter um grande desgosto por vermos as outras mais bem vestidas que nós.

21. Empregar palavras triviaes quando falam. Nada há que faça peior effeito, que ouvir sair da bocca de uma menina termos usados por gente ordinaria.

22. Não obedecer aos paes e professores, não mostrar obediencia a todas as pessoas de respeito, não ser bondosas para as companheiras e criadas, não ter consideração pelos desejos e sentimentos dos outros, não ser modestas no porte, e finalmente, não observar as pequenas regras, que constituem a boa educação de uma menina.

APPENDICE

Do modo de escrever cartas

1. As cartas são um meio pelo qual podemos manifestar os nossos pensamentos e affectos aos que se acham distantes, assim como de viva voz fazemos com os presentes.

2. Diversas são as especies de cartas: politicas, scientificas, artisticas, didaticas, consoante tiverem relação com a politica, as sciencias, as artes, o estudo, etc. Chamam-se familiares quando versam sobre assumptos de familia: a esta categoria pertence o maior numero de cartas que se escrevem.

3. Caracter proprio das cartas familiares é a simplicidade e despreocupação do estylo. Uma linguagem abstrusa repugna á espontaneidade que devem ter taes cartas.

4. Quando pedires por carta algum favor, não te percas em protestos e promessas exageradas que seriam contraproducentes; procura expôr o teu pedido com simplicidade e singeleza, qualidades que impressionam a todos os corações.

5. As sentenças, os proverbios, as maximas, e alguns chistes, dão graça e vida ás cartas. Devem, comtudo, ser usados com moderação; a demasia é affectação, assim como a abstenção completa de taes cousas é rusticidade.

6. Devem-se evitar, quanto possivel, as perguntas a superiores; sendo, porém o caso, usar-se-ão estas e semelhantes phrases: “permita-me a liberdade de lhe perguntar – desculpe-me o atrevimento, a ousadia de” – Aos superiores tambem não se deve dar encargo de transmitir saudações ou recados.

7. Para com eguaes permitte-se essa liberdade; não se dispensa, porem o adoçar um pouco estes pedidos por exemplo: Queira ter a bondade de transmitir minhas saudações a Fulano,

8. Quando se faz menção d´uma pessoa, antecipa-se sempre algum adjectivo ou palavra: senhor; por exemplo: O Snr. Professor Fulano, o illustre senador Cicrano, o senhor Director etc.

9. Três são as partes essenciaes d´uma carta: a introducção, o argumento e a saudação. A introducção ou exordio é, por assim dizer, uma explanação do caminho de modo adaptado ao assumpto de que se vae tratar. É, em geral, brevissimo e ás vezes pode-se até omitir. Quando, porem, a carte é de resposta, especialmente a pessôas notaveis, deve-se sempre accusar a data e o argumento da carta a que se responde.

10. O argumento ou o corpo da carta, comprehende tudo quanto se pretende dizer, seja pergunta, seja pedido, convite etc.

11. Sob o nome de saudação, entende-se em geral os augurios, os cumprimentos, os protestos de reverencia e amizade com que nos costumamos despedir da pessoa a quem escrevemos. As cartas escriptas aos superiores poderão terminar com expressões mais ou menos como estas: Com a mais alta estima – com o mais sincero respeito – com a mais profunda veneração – me professo de V. Excia, servo humilde e obrigado. A simples amigos e conhecidos : amigos sempre ás ordens. Renovo os protestos da minha amizade etc; nas de agradecimentos : Com a mais viva gratidão, com o mais sincero reconhecimento etc.

E assim nos diversos casos, devem-se usar sentimentos e expressões adequadas.

12. Permitem-se ás vezes os “post escriptum”, (P.S.) para acrescentar no fim da carta alguma cousa ao que ficou dito; mas como isso revela em geral esquecimento e distracção, deve-se esse uso limitar ás cartas entre pessoas intimas.

13. Terminando a carta, deves dar o conhecer que não és pagão, por isso accrescente sempre algum pensamento christão, se já não o fizeste no decurso da carta.

14. O papel da carta deve ser limpo e inteiro; para os parentes íntimos e amigos poderá servir uma folha simples, ás pessoas gradas escreva-se sempre em papel duplo.

15. A calligraphia deve ser nitida e esmerada. É incivil mandar uma cara com borrões ou emendas. Deixe-se sempre no papel alguma margem á esquerda.

16. Procura nunca omitires a data, o titulo da pessoa a quem escreves, o qual não deve ser abreviado, a tua assignatura no fim da carta e o endereço.

17. Antes de começar a carta é preciso deixar duas ou tres linhas em branco si se escreve a pessoa de importancia. Ao findar a pagina deve-se continuar na folha seguinte á altura do titulo; isto, porém, no caso de a carta ter apenas duas paginas. Nas cartas intimas permitte-se escrever em ambos os lados da folha.

18. A data deve indicar o logar, o dia, o mez e o anno em que se escreve. Está prevalecendo o uso de datar as cartas logo no principio, mesmo escrevendo a superiores.

19. A assignatura ou o nome de quem escreve, occupa o ultimo logar, á direita, e separado do corpo da carta. Por exemplo:

De V. Senhoria

Att° criado e admirador

Fulano de Tal

20. O endereço consta do nome e sobrenome da pessoa a quem se escreve, precedidos dos respectivos titulos; da indicação da rua, do numero da casa, (e tambem, si fôr preciso, da província e do paiz) e por fim da cidade, villa ou localidade.

21. O sobrescripto deve-se revestir de toda a exactidação e clareza possiveis. O titulo geral (p.ex: Ill° Snr.), occupa o primeiro logar no alto do envelope e um pouco á esquerda. Segue-se-lhe, na outra linha, o nome e o sobrenome junctamente com o titulo honorifico (p. ex: DD. Prefeito Municipal) – Na linha immediata escreve-se o nome da rua e o respectivo numero, no fim as demais indicações, sendo que a cidade ou logar occupa o ultimo logar á direita.

22. Nas cartas que se mandam por intermédio d´uma terceira pessoa, em vez de nome da rua etc, costuma-se pôr simplesmente : por especial favor ou abreviadamente P. E. F.

23. Quanto á frequencia em escrever, evitem-se os excessos: alguns escrevem a todos, a cada passo e por qualquer ninharia; outros nem siquer respondem ás cartas recebidas ou o fazem após longo tempo. Use-se um razoavel meio termo, como já se observou falando das visitas.

24. Os titulos mais conhecidos são:

Ao Papa: Sua Santidade

A um Rei: Sua Magestade

Ao Snr. Presidente da Republica, Ministros de Estado, Senadores, Deputados e em geral a pessoas de grande distinção: Sua Excellencia, Ill° Ex.° Snr.

Aos Cardeais: Sua Eminência, Em.°

Aos Bispos: Sua Excellencia Reverendissima, Ex.cia , Rev.ma.

Aos Sacerdotes: Reverendissimo

Aos Cidadãos: Illustrissimo ou Excellentissimo Snr.

Quanto a cartas, observa mais as seguintes regras:

Guarda-te de:

25. Abusar dos bilhetes postaes para correspondencia particular. Para recados insignificantes servem perfeitamente; mas para qualquer comunicação de maior importancia, não se deve usar, pois é offensivo para a pessoa com quem nos correspondemos.

26. Escrever cartas em papel ordinário, ou que não seja proprio para esse effeito. É de bom gosto usar as nossas iniciais ou o nosso monograma no papel em que escrevemos, sem mais nenhuma decoração. O papel deve ser tambem simples, mas de boa qualidade.

27. Humedecer o sobrescripto, levando-o á bocca para esse fim. Este costume é vulgarissimo e difícil de acabar, pela simples razão de não termos, muitas vezes, á mão outra maneira de pôr uma estampilha ou fechar um sobrescripto. O melhor systema é molhar o dedo em agua e humedecer em seguida a goma. Assim devemos fazer, sempre que seja possivel. Este habito, além de podido, é summamente higiénico.

29. Usar nas cartas um estylo muito empolado. Deixemo-nos de affectações e usemos sempre um estylo simples e comprehensivel.

29. Esquecer-te de agradecer todos os convites que te dirijam, quer sejam aceitos quer não, e deixares tambem de responder ás cartas que receberes.

30. Enviar cartas sem franquia, obrigando por esta forma os destinatarios a pagar multa.

31. Quando escreveres a uma senhora, por no alto da pagina: Minha senhora, em vez de Exma. Snra.

32. Fazer entrelinhas e cruzar as linhas, quando escreveres uma carta.

33. Numa carta comprida, não collocar as folhas por ordem, afim de não embaraçar a pessoa que a recebe. Quando as paginas são muitas, o melhor é numera-las.

34. Tanto na escripta como na conversação, empregar palavras extrangeiras, o que só mostra affectação. Devemos, sobretudo, evita-las, caso a pessoa, a quem nos dirigimos, não conheça a língua a que ellas pertencem.

35. Escrever cartas de apresentação levianamente, sem attendermos se as pessoas a quem as dirigimos, terão gôsto em conhecer as que lhes apresentamos.

36. Fechar o sobrescripto de uma carta de apresentação, quando vai por mão do proprio apresentado.

37. Mencionar nomes em bilhetes postaes quando se tratarem de assumptos importantes ou melindrosos : estes, aliás, nunca se deveriam tratar em bilhetes postaes.

 

INDICE

Prefacio dos Editores............................................................ 02

Cap. I – Dos deveres para com Deus.......................................... 04

II – Dos deveres para com aos paes....................................... 05

III – Dos deveres para com os superiores ................................ 07

IV – Dos deveres para com todos.......................................... 09

V – Dos deveres para consigo mesmo ................................... 11

VI – Procedimento na Egreja .............................................. 11

VII – Procedimento na aula ................................................... 13

VIII – Procedimento na sala de estudo ............................ ........ 16

IX – Na mesa ................................................................... 17

X – Ainda sobre o procedimento á mesa ................................ 24

XI – Da conversação .......................................................... 28

XII - Ainda sobre a conversação ............................................ 35

XIII – Dos recreios ............................................................. 38

XIV – Do proceder fóra de casa ............................................ 41

XV - Ainda sobre o procedimento fóra de casa ........................ 44

XVI – Das visitas ................................................................ 46

XVII – Das reuniões, theatros, academias etc. ......................... 52

XVIII – Do asseio ................................................................. 54

XIX – Do vestuario, porte e habitos pessoaes .......................... 58

XX – Da saudação ............................................................. 63

XXI – Do proceder nas viagens .............................................. 65

XXII – Do proceder como hospede .......................................... 67

Preceitos Geraes ................................................................ 69

Na casa alheia ................................................................... 70

Para as crianças .................................................................. 70

Para os rapazes ................................................................ 70

Para as meninas ................................................................. 72

Appendice – Do modo de escrever cartas ................................. 74